:: ‘golpe’
Camisas vermelhas, camisas azuis e o jogo sujo
Daniel Thame
O time de camisa vermelha jogou contra o time de camisa azul.
Comandado por uma menina sem muita técnica mas com espírito guerreiro, o time de camisa vermelha, mesmo tendo toda a crônica esportiva contra, ganhou do time de camisa azul, comandado por um menino mimado, que só entrou no jogo por causa do avô famoso.
Ganhou apertado, mas ganhou.
Mas aí o menino mimado do time de camisa azul decidiu que a menina guerreira do time de camisa vermelha poderia até ganhar, mas não iria levar.
Mau perdedor, protegido pela crônica esportiva que ignora ou reduz a pó todas as suas estripulias, e diante da complacência dos juízes que só dão cartão vermelho pro time de camisa vermelha e não dão nem cartão amarelo pro time de camisa azul, o menino mimado entrou em campo pra tumultuar, travar o jogo.
Jogar sujo.
O time de camisa vermelha, que pra ganhar quatro títulos seguidos teve que se reforçar com jogadores que não estão nem ai para a cor da camisa, foi descobrindo aos poucos que o jogo era pesado demais.
E, pior, que o segundo principal jogador do time, aquele do grupo dos que vestem qualquer camisa mas sempre estão de olho na faixa de capitão, estava se bandeando para o lado dos caras de camisa azul, que não aguentavam mais perder títulos para o time de camisa vermelha e queriam ganhar um título nem que fosse no tapetão.
Sem nenhum fair play, jogadores que sempre tiveram as maiores vantagens por se aliarem ao time de camisa vermelha, foram montando o próprio time, que hoje joga de azul, mas amanhã pode jogar com qualquer cor, desde que possa ficar a mão no troféu.
Com a crônica esportiva martelando que tapetão era jogo limpo e a maior parte da torcida, até então mais propensa ao time de camisa vermelha, passando pra arquibancada do time azul, só restava apelar para o Supremo Tribunal Futebolístico, o STF.
Mas qual o que? Os juízes do STF simplesmente lavaram as mãos, deixando o time de camisas vermelhas com os calções na mão. Cegos, surdos e mudos.
Daí que o resultado dentro de campo foi solenemente ignorado, o jogo sujo permitido, a traição virou regra e numa madrugada cinzenta jogadores de times de várias camisas se uniram e deram um chute no traseiro do Campeonato Brasileiro de Democracia.
Assim, eles roubaram o jogo.
E já podem roubar o país inteiro, porque o negócio era lavar a jato e tirar de campo o time de camisa vermelha.
O resto, bem o resto não vem a caso, torcida brasileira.
7×1, 7×1, 7×1, 7×1.
E tome gol da Alemanha!
Dilma diz que decisão do afastamento “é golpe”
A presidenta Dilma Rousseff publicou em seu perfil no Facebook, às 8h30, que a decisão do Senado de abrir processo de julgamento contra ela “é golpe”. Dilma, que acompanhou toda a votação da admissibilidade do processo de impeachment no Palácio da Alvorada disse que “quanto mais uma palavra se aproxima da realidade que se quer esconder, maior o incômodo que seu uso traz.”
No post, que traz o vídeo do advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, em seu discurso de defesa da presidenta na sessão do Senado, Dilma destacou o trecho em que Cardozo alegou que “se está usando pretextos jurídicos para tirar do poder uma presidente legitimamente eleita do poder em uma injustiça histórica.”
Viva a hipocrisia!
Juca Kfouri, no Uol
Festa na CBF!
Michel Temer presidente interino do Brasil!
O Marco Polo que não viaja (Viaja, Marco Polo, viaja!) poderá, ao menos, voar até Brasília e voltar a frequentar o Palácio do Planalto.
O PT saiu do poder. Maravilha!
Que pague por seus erros, por ter sido igual aos que criticava.
Agora temos o PMDB! Extraordinário!
Sangue novo com Temer (Lava Jato), Romero Jucá (Lava Jato), Eliseu Padilha (Precatórios), Moreira Franco (Proconsult), Gedel Vieira Lima (Lava Jato), Henrique Alves (Lava Jato), todos protagonistas de escândalos, da Operação Lava Jato ou de outros mais antigos, além de terem servido a todos os governos, inclusive os do PT, como ministros.
Festa também no “Movimento Brasil Livre”, cujo fundador , Renan Antônio Ferreira dos Santos, responde a mais de 60 processos e deve quase 5 milhões de reais na praça.
O líder certo na hora certa!
Como Eduardo Cunha, não nos esqueçamos de homenageá-lo in memoriam, ele que deu o pontapé inicial em todo o processo saneador e que agora, cinicamente, é descartado como bagaço mascado.
E que se mencione também Aécio Neves, que tanto se sacrificou pela causa, a ponto de ter virado mico, xingado nas ruas.
Agora vai!
Silêncio nas panelas. A elite branca já pode dormir em paz.
Ninguém segura este país.
Ame-o ou deixe-o.
Rui: “foi um atentado à Democracia”
O governador Rui Costa manifestou, em sua página no Facebook, “a solidariedade à presidente Dilma, que não cometeu nenhum ato ilícito que justificasse o processo de impeachment”.
“O que aconteceu hoje foi mais um atentado à Democracia. Uma violência contra a escolha de milhões de brasileiros. Estamos vivendo um triste momento da história do país, mas nada vai me abater a continuar defendendo a democracia e os legítimos interesses da Bahia”, disse.
Rui: ‘presidentes legítimos são os que vêm das urnas’
Em entrevista coletiva após visitar as obras da Concha Acústica do Teatro Castro Alves nesta quarta-feira (11), o governador Rui Costa (PT) voltou a defender ‘eleições extraordinárias para presidente’ da República, diante da já inevitável admissibilidade da abertura do processo de impeachment de Dilma Rousseff, cuja votação acontece nesta noite no Senado.
“É preferível eventualmente uma eleição direta que a imposição de alguém que não tem a aprovação”, disse Rui em referência à ascensão do vice Michel Temer durante até 180 dias de afastamento de Dilma (prazo limite para que haja decisão pela perda do mandato ou não).
“Acho que o Brasil precisa adotar medidas, e o governante precisa ter legitimidade para adotar essas medidas. Precisa ter força política, e não apenas força parlamentar. Uma coisa não tem a ver com a outra. Tem que ter legitimidade e força política, e força política se consegue com voto. Acho que, no limite, seria aceitável uma solução, e alguns senadores e deputados têm defendido isso: convocação extraordinária de eleições. Tanto a presidente quanto o vice abririam mão de seus mandatos. Seria melhor para o país, e nós encontraríamos um ambiente mais legitimado para fazer as alterações que o Brasil precisa”, avalia o governador baiano. (Brasil247)
A noite escura do Brasil
Fernando Drummond
Há noites que duram anos. Há dias que duram séculos. Esta foi uma noite e este será um dia. Escolhi o lado difícil da história, escolhi o lado ‘justo’ da história. Poderei dizer a meus futuros filhos e netos que a primeira mulher Presidenta do Brasil foi usurpada do poder por seres humanos traidores, vendidos, sem palavra e sem honra.
Sob à tutela de Deputados com contas na Suíça, ex-Presidente da República desviando dinheiro para bancar, no exterior, amante e filho, Senadores traficantes de drogas, Senador que possui trabalho escravo em seus latifúndios, fanáticos religiosos e tantos outros. Esta mesma mulher, que aguentou, por três anos, a prisão, tortura física, moral e sexual, aguenta, de pé, a mesma tortura, com a devida proporção. Houve erros? Sim.
Houve alianças espúrias? Sim, em nome de uma frágil governabilidade. Aliás, poderia enumerar uma série de equívocos, mas não foram eles os responsáveis por tirar Dilma Vana Rousseff do poder. Foram seus acertos. Quando Lula foi eleito em 2002, a Casa Grande apostou em quatro anos de fracasso, estampado no medo de Regina Duarte, a namoradinha do Brasil.
Os governos de Lula foram os melhores da história de nosso país, fazendo sua sucessora duas vezes. Ah, isso é inadmissível para a elite. Como um analfabeto, torneiro mecânico, pode chegar tão longe e ser o brasileiro com maior títulos Doutor Honoris Causa? Enfim, a Casa Grande não suportou ver o povo pobre ocupar a vaga de seus filhotes nas universidades federais, que, em tempo, nos últimos treze anos foram criadas mais do que nos quinhentos e dois anos anteriores. A Casa Grande não admitiu que empregadas domésticas (um termo lamentável) tivessem mais direitos, pois ficou mais caro “tê-las”. Para eles, é um absurdo, um outro ser humano ter mais direitos trabalhistas.
A Casa Grande não suportou o fato de ver 40% a mais de negros adentrar o portão principal das universidades. Aeroporto ter virado rodoviária. A Casa Grande tremeu com a alta do dólar, atrapalhando seus passeios anuais para Miami. Tantos e tantos outros exemplos que só mostram que a Casa Grande precisa tirar esta mulher do poder, afinal eles precisam da Senzala para que nunca deixem de ser A Casa Grande.
Réquiem
Gabriel Priolli
Encerra-se nesta data o período de plenitude democrática inaugurado no país em 5 de outubro de 1988, com a promulgação da “Constituição Cidadã” ora revogada pelo impeachment da Presidenta Dilma Rousseff.
Inicia-se um regime plutocrático de completa incerteza política e jurídica, em que as garantias constitucionais e legais serão exercidas seletivamente, em exclusivo benefício dos donos do poder e em prejuízo de tudo que representar as forças populares.
Fica estabelecido que o novo regime exercerá o poder pela farsa e que as eleições serão mero exercício de manutenção das aparências, tendo o seu resultado respeitado apenas se ele coincidir com o interesse do poder dominante.
Determina-se, em decorrência, que toda vez que a esquerda política estiver em condições de conquistar o poder pelo voto, seus candidatos serão perseguidos até que sejam inabilitados.
Caso não se obtenha por meios persecutórios a sua retirada do páreo e eles venham a ganhar a disputa, o pleito não será reconhecido e um imediato processo de impedimento será iniciado.
Revoga-se desde já qualquer objeção da Justiça ao disposto neste édito, na hipótese remota de que seja apresentada.
Permanecerão os tribunais na completa omissão de suas responsabilidades, que será devidamente recompensada com régia remuneração e infinitas prebendas.
Que Deus tenha misericórdia desta Nação. Que possa ensiná-la a viver, doravante, assim dividida, conflagrada e nutrida de ódios.
Brasília, aos 11 dias do mês de maio do ano da graça de 2016, início de uma nova era de efetiva ordem e progresso no Brasil – ou apenas ordem, quando não for possível o progresso.
O Brasil não acaba nesta quarta-feira…
Renato Rovai, no Blog do Rovai
A não ser que algo absolutamente tsunâmico venha a acontecer Dilma será afastada hoje do cargo de presidenta da República e será substituída pelo golpista Michel Temer. Será o fim de mais um episódio da série Brasil, mas não o fim dessa história.
Já na quinta feira começa um novo episódio, cujo título não será Golpe e Conspiração, mas que contará o destino de um governo ilegítimo, que terá de compor com o que há de pior na política brasileira e que enfrentará uma resistência cidadã que tende a crescer de maneira digital e não analógica.
Essa turma que vaza cartas e áudios com ensaios do discurso do golpe sabe como desestabilizar governos. É expert em manhas e artimanhas palacianas. Conta com a midiazona inteira para construir narrativas destrutivas. Mas a partir de agora terá de lidar com um país muito diferente do que entregou em 2003.
Um país que sabe que o Estado pode ser indutor de desenvolvimento social. Que conheceu o Bolsa Família, o Minha Casa Minha Vida, cotas nas universidades, o ProUni, os Pontos de Cultura, o Mais Médicos, o Luz pra Todos e tantos outros programas que mudaram milhões de pessoas de andar na pirâmide social.
Esses programas fizeram com que garotos que tinham oito anos em 2003 e hoje estão com 21 possam viver de forma muito diferente do que seus pais ousaram sonhar.
Essa garotada também está conectada. Conversa em lista de whatsapp sobre música, futebol, baladas e política. E de algo uma forma ainda só assistiu esse episódio que deve se encerrar hoje.
Até porque o Brasil vive uma crise econômica e a uma instabilidade política de grandes proporções. E isso piorou muito a vida do povo nos últimos dois anos.
Muitos desses garotos perderam empregos, outros nem conseguiram arrumar e muitos outros estão vendo pais, mães, irmãs, primos, vizinhos etc. na mesma situação.
E enquanto isso acontece há uma força bruta que lhes diz que isso só vai se resolver se ela cair.
Que só há possibilidade de amanhã se Dilma, Lula, o PT e essa quadrilha de corruptos forem varridos do mapa.
Muito por conta disso, essa juventude, em sua imensa maioria, não foi às ruas em atos de resistência ao golpe. Mas também não foui pedir a cabeça de Dilma.
Ela ficou assistindo.
Até porque ao que parece o que o destino lhe reserva não é um papel secundário, mas de protagonista.
É neste novo episódio da obra Brasil que se inicia amanhã que este novo ator, que já se insinua nas ocupações das escolas públicas, deve surgir forte.
Em geral é assim. O novo episódio já começa nos últimos capítulos do ciclo anterior.
E o episódio que virá será o da juventude classe D e C conectada. Ela escreverá boa parte da história da resistência.
Não tenho dúvida disso.
Essa juventude não aceita um governo liberal. Ela quer mais Estado. Mais educação e saúde pública de qualidade, mais programas de inclusão, mais possibilidades para disputar melhores empregos, mais equipamentos de cultura, mais áreas de lazer, mais consumo etc.
Por mais contraditório que possa parecer, mesmo achando que tudo que consegue é fruto da sua batalha individual, ela não tem nada de neoliberal.
E por isso era muito difícil construir uma consciência coletiva para esse imenso novo grupo social na sustentação de um governo. Mas isso pode vir a acontecer agora nas lutas de resistência.
Esse é o fato novo que pode desestabilizar muito mais rapidamente do que muitos ousam imaginar o governo Temer.
A combinação das lutas dos setores clássicos da esquerda com essa ação distribuída e com jeito de não organizada da molecada tende a ser imbatível.
Principalmente se Temer optar pela porrada como forma de garantir a ordem.
Na sociedade conectada em redes e onde cada pessoa com um celular é um mídia, a porrada tem se mostrado o melhor combustível para ampliar movimentos mundo afora.
Por isso, o jogo não está jogado e não é tão simples como pode parecer para alguns.
O impeachment de Dilma é uma quebra institucional caríssima para a nossa democracia, mas também pode significar o nascimento de algo novo.
É preciso apostar nisso, mesmo em meio a tudo que virá. E que promete ser pra lá de bruto.
É preciso tentar buscar compreender melhor o novo que começa a brotar.
Muitas vezes é no anoitecer que a gente entende melhor o que foi o dia e o que ele produziu. E que pode se preparar melhor para o outro dia que virá.
É quase certo que vivemos o fim de um ciclo de 13 anos da nossa história. Mas não estamos vivendo o fim história.