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Daniel Thame, jornalista no Sul da Bahia, com experiência em radio, tevê, jornal, assessoria de imprensa e marketing político danielthame@gmail.com

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:: ‘Les Misérables’

Os Miseráveis

 

Por Raquel Rocha

 

 Tous les Misérables

Antes de assistir Os Miseráveis que concorre ao Oscar resolvi rever todas as versões que já tinha visto no passado. A de 1935 de Richard Boleslawski, o filme de 1952 de Lewis Milestone, e a produção de 1998 de Bille August. Tive esse trabalho, por sinal muito prazeroso, como uma espécie de ritual preparatório para o que seria o Grande Filme a contar essa história que nunca ficará velha.

Minha expectativa não era gratuita, os motivos eram muitos, a direção de Tom Hooper de “O Discurso do Rei” que é um filme pelo qual tenho um apreço pessoal, o gênero musical que cai como uma luva nessa história, o elenco com nomes como Russell Crowe e Hugh Jackman; e a produção do filme que fez com que todos os atores cantassem ao vivo durante as gravações.

Mesmo com tanta expectativa ou por causa dela, terminei o filme com a sensação de que faltava algo. E ao analisar todos os detalhes que julgava terem ficado fora percebi que seria impossível um filme contar toda a história dessa grande obra prima de Vitor Hugo com quase 3000 páginas publicada em 1862. Descobri então que gosto mesmo é da história em si e por isso acabo gostando de todas as tentativas de contá-la, mesmo que no final fique sempre a impressão de que faltou algo.

Por esse motivo hoje vou falar mais da história de Les Miserábles escrita por Vitor Hugo do que sobre o filme que concorre ao Oscar no próximo dia 24. Porque, conhecendo ou relembrando essa história magnífica, todos os filmes sobre ela passam a ser mais que recomendados. E acreditem é uma história que vale a pensa ser lida/assistida quantas vezes for possível. Como escreveu Vitor Hugo (e Richard Boleslawski fez questão de colocar na abertura do seu filme de 1935): “Enquanto houver neste mundo que chamamos de civilizado um sistema em que homens e mulheres, mesmo tendo pagado as suas dívidas perante a lei e expiado suas ofensas, ainda sejam perseguidos onde quer que estejam, essa história não vai ser contada em vão”

A história se passa na França do século XIX. Jean Valjean, após procurar emprego e não encontrar, acaba roubando um pão para alimentar sua irmã e seu filho que passam fome. É levado a julgamento e condenado a 5 anos de trabalhos forçados na prisão de Galés que acabam se transformando em 19 anos devido as suas tentativas de fuga. Nessa prisão Jean perde sua identidade e passa a ser condenado 24601. O vigia Javert é seu carrasco, implacável seguidor da lei e da ordem parece não ter compaixão pelos prisioneiros.

Jean Valjean entra na cadeia como um homem bom que cometeu um erro mas é libertado com a maldade em seu coração, embrutecido, amargurado e envelhecido. Precisa se apresentar as autoridades mensalmente e se não o fizer ele volta pra prisão perpetua. Jean sai com a identidade amarela e o carimbo de ex condenado e por isso não consegue emprego, nem abrigo, nem comida apesar de carregar consigo um pouco de dinheiro.

O único que lhe dá abrigo é Don Bienvenu, o bispo de Digne que abre as portas de sua casa, o alimenta e o chama de irmão. Mas Jean não entende mais o que é a bondade, pois nos últimos 19 anos só conheceu seu oposto. Apesar do bispo ter-lhe estendido a mão Jean o rouba de madrugada e foge. Não consegue ir muito longe, policiais o prendem com a prataria do bispo e o levam de volta. Esse trecho é o ponto alto da história, todas as vezes que ela é contada. É aquela parte que da vontade de reler e voltar no controle remoto, pra ver se o que aconteceu realmente aconteceu.

O bispo ao ver os policiais entrando em sua casa com Jean detido ordena que o libere dizendo que deu-lhe a prataria de presente.. Olha para Jean, diz que ele esqueceu o mais valioso e entrega-lhe dois castiçais de prata. O gesto e as palavras do bispo são marcantes em todas tentativas de contar essa história.

“Eu que devo agradecê-lo, É quem dá que se beneficia mais, meu filho” (filme de 1952)

“Há muito tempo Jean, eu aprendi que a vida é doar e não levar. Permita-me doar.” (filme de 1935)

“O caminho certo Jean, sempre está aberto a você.”(filme 1935)

“Deus te tirou da escuridão” (filme 2012)

“Jean Valjean, meu irmão, lembre-se de que já não pertence ao mal, mas sim ao bem. É sua alma que acabo de comprar. Eu a furto dos maus pensamentos e do espírito da perdição para entregá-la a Deus.” (livro)

Jean sai da casa do santo bispo confuso, envergonhado mas já é um homem transformado, decidido a fazer pelo outro o que o bispo fez por ele. Para se livrar do estigma de ex condenado Jean muda seu nome para Madeleine. Enriquece, se torna dono de uma fábrica de cerâmica. Adorado por todos é nomeado prefeito da cidade. Tudo parece dar certo na vida de Jean até que ele se encontra com o inspetor de polícia da cidade, Javert, seu antigo carrasco em Galés. Javert acha a fisionomia do novo prefeito conhecida mas não o associa ao condenado 24601, que agora é fugitivo da lei por não ter se apresentado periodicamente as autoridades.

Um ato de generosidade denuncia Jean: um velho está preso embaixo de uma carroça, ninguém consegue levantá-la mas Jean entra embaixo e a levanta com as costas fazendo com que Javert desconfie de sua verdadeira identidade: “Até hoje, só conheci um homem capaz de fazer isso. Era um forçado das galés” (livro)

Vou parar a narrativa nesse ponto da história que é quando começa a saga de Jean, perseguido o tempo todo pelo inspetor Javert obcecado em prendê-lo para cumprir a lei. No entanto não posso fazê-lo sem falar um pouco sobre os personagens construídos por Vitor Hugo com uma profundidade comparável a de Dostoievski, com diferença que a ênfase de Vitor Hugo é na história de cada personagem, e cada dessas histórias daria outro livro.

Javert, o vilão, no fundo não é um vilão. É um menino que nasceu em uma prisão pois seu pai era um condenado. Javert aprendeu a dividir o mundo em duas categorias os que seguem e os que não seguem a lei. E ele é implacável com quem comente erros, inclusive consigo mesmo. Devido ao seu excesso de rigidez Javert não consegue compreender as atitudes benevolentes de Jean Valjean. “A lei não me permite ser misericordioso.” (Javert,  filme de 1998)

Fantine é uma moça que foi abandonada grávida pelo homem que amava. “Para o rapaz, Fantine foi só uma aventura. Para ela, foi seu primeiro amor. A ele se entregou completamente. Do romance, nasceu uma menina: Cosette.” Como sofreria retaliações por ser mãe solteira acabou por deixar a filha Corset em uma estalagem sob os cuidados de um casal e sai em busca de trabalho pra manter a filha. Fantine trabalha na fábrica do Sr. Madeleine até que seu segredo é descoberto e ela é despedida, indo se prostituir nas ruas pra continuar mandando dinheiro para que cuidem de sua filha.

Corset é a filha de Fantine. É uma criança e mora com os donos da estalagem que extorquem dinheiro de Fantine e maltrata a menina. É resgatada por Jean quando este descobre a situação de Fantine após ser despedida de sua fábrica.

O filme se passa em 4 fases: A primeira é a condenação de Jean pelo roubo do pão. A segunda é sua saída da prisão e o encontro com o Bispo. A terceira é quando Jean se torna próspero sob a identidade do Sr. Madeleine e a quarta é quando Jean tenta cuidar de Corset que se tornou uma bela moça. (Confesso que Corset é a personagem que acho menos interessante no livro e em todos os filmes.)

De volta ao planeta terra, Oscar 2013, Os Miseráveis de Tom Hoper é um filme sustentado pela força dos atores. Hugh Jackman consegue dar vida e passar verdade como Jean Valjean. Achei que assistiria o filme todo imaginando garras saindo de suas mãos mas.. que Wolverine que nada, o que a gente vê em Jackman é o olhar daquele que se torna bruto e depois se torna bom, o olhar de Jean Valjen. Segundo o ator esse personagem teria sido o maior desafio da sua carreira, e ele cumpriu bem a missão. Seu momento máximo no filme é quando ele sai da casa do bispo.

Russell Crowe como cantor é um excelente ator. A proposta do filme era realmente que as afinações não fossem perfeitas, pra passar emoção e verdade. Mas não funcionou com Crowe que manteve a postura e expressão do personagem mas quando começava a cantar não convencia. Helena Bonham Carter (Madame Thénardier e Sacha Baron Cohen (Monsieur Thénardier) fizeram uma excelente atuação mas achei que o clima das cenas deles destoava do filme. Amanda Seyfried não chamou minha atenção, mas talvez tenha sido pela minha falta de simpatia pela personagem Corset adulta.

A grande interpretação do filme, que realmente me surpreendeu foi a de Anne Hathaway. E não é porque ela emagreceu, cortou o cabelo e enfeiou (fórmula pra se ganhar o Oscar) foi porque ela conseguiu transmitir todo desespero de Fantine que tem sua vida devastada e precisa encontrar força onde já não existe. Foi uma atuação magistral, emocionante, cantando “I Dreamed a Dream”: “Mas há sonhos que não podem ser. E há tempestades que não podem passar. Eu tive um sonho que minha vida seria tão diferente deste inferno que estou vivendo”

Nunca é demais lembrar que esse é um musical e a recomendação é pra quem gosta de musicais. Porque esse é um musical na acepção do gênero, é cantado do começo ao fim, diferente daqueles filmes que o povo conversa aí para e da uma cantadinha, aí conversa de novo e para da outra cantadinha. Esse não tem conversa.

Bom Os Miseráveis de Tom Hoper é isso, mais uma tentativa de contar essa história de injustiça, coragem, sacrifícios e redenção. Uma tentativa imperfeita, como todas foram e todas serão, mas que tem seus méritos e merece ser vista  e sentida de alma aberta.

 

Trailer

 

Ficha Técnica

Elenco: Sacha Baron Cohen, Helena Bonham Carter, Anne Hathaway, Amanda Seyfried, Hugh Jackman, Russell Crowe, Eddie Redmayne, Samantha Barks, Aaron Tveit, Colm Wilkinson, Ella Hunt, George Blagden, Daniel Huttlestone, Bertie Carvel, Isabelle Allen, Frances Ruffelle, Alistair Brammer, Evie Wray, Kerry Ellis, Tim Downie, Killian Donnelly, Alexander Brooks, Fra Fee, Sophie Ellis, Jean-Marc Chautems, Jonny Purchase, Lily Laight, Linzi Hateley, Scott Stevenson, Nathanjohn Carter, Dick Ward, Nancy Sullivan, Gabriel Vick, Catherine Woolston, Jaygann Ayeh, Paul Leonard, Gino Picciano, Olivia Rose Aaron, Jackie Marks, Julia Worsley, AlisonTennant, Josh Wichard, Sara Pelosi, Henry Monk, Adebayo Bolaji, Sammy Harris, Adam Nowell, Rosa O’Reilly, Stevee Davies, Robyn North, James Charlton, Alice Fearn, Kelly-Anne Gower, Iwan Lewis, Jos Slovick, Richard Dalton, Matt Harrop, Mary Cormack, Gary Bland, Adam Pearce
Produção: Eric Fellner, Debra Hayward, Cameron Mackintosh

Roteiro: William Nicholson, baseado na obra de Victor Hugo

Notas

-As referências ao livro neste texto são da tradução e adaptação de Walcyr Carrasco.

-Os Miseráveis recebeu 8 indicações ao Oscar 2013: Concorre nas categorias de melhor filme, ator (Hugh Jackman), atriz coadjuvante (Anne Hathaway), design de produção, figurino, maquiagem, mixagem de som e canção (Suddenly).

-O filme não é uma adaptação direta do livro de Vitor Hugo mas de um musical da Broadway.

-Essa é um texto de opinião, todas as colocações aqui são convicções pessoais baseadas muito mais na experiência emocional do que em conhecimentos teóricos sobre cinema.





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