:: ‘Dr. Juca’
Documentário ´Doutor Araguaia` será apresentado em Recife e Natal
O documentário ´Doutor Araguaia`, que teve seu lançamento oficial em Palmas, no Tocantins, em dezembro passado, inicia sua trajetória no ano de 2025 com exibição na 14ª Bienal da União Nacional dos Estudantes-UNE, em Recife; e em Natal, para professores universitários e lideranças do PCdoB do Rio Grande do Norte, cumprindo a meta de lembrar e homenagear as lideranças estudantis que fizeram história na luta contra a Ditadura Civil Militar, de 1964 a 1985.

Dr. Juca
O documentário, com duração de 90 minutos, narra a história do médico gaúcho João Carlos Haas Sobrinho, brilhante estudante de medicina, natural de São Leopoldo/RS (1941), que foi preso em 1964, só porque era presidente do Centro Acadêmico Sarmento Leite, da Faculdade de Medicina da UFRGS. Após concluir seu curso e com grande espírito de liderança, alinha-se à filosofia do PCdoB da época, tornou-se médico pioneiro nas regiões de Porto Franco/MA e Xambioá/TO.

Entre 1967 e 1972, salvou centenas de vidas, sendo amado pelos camponeses – que sofriam com o regime de exceção – e por todos que com ele conviveram.
Dr. Juca foi morto na região do Bico do Papagaio, na Guerrilha do Araguaia e até hoje a família continua na busca dos seus restos mortais – que nunca foram encontrados.
O filme é uma produção independente da TG Economia Criativa, dirigida pelo documentarista Edson Cabral, com roteiro, pesquisas e argumento realizados em parceria com Sônia Haas, irmã do protagonista.

O diretor Edson Cabral e a irmã de João Carlos Haas, Sonia Haas
Contemplado pelo Edital 001/2023 da Lei Paulo Gustavo – Tocantins, o documentário conta, também, com o apoio das Prefeituras de São Leopoldo/RS e Porto Franco/MA e com apoio institucional da Fundação Mauricio Grabois – FMG.
´Doutor Araguaia´ é um tributo a todos que lutaram e continuam lutando contra a tragédia que foi a Ditadura Civil Militar no Brasil – uma história para ser conhecida.
Serviço:
Recife – PE, Bienal da UNE, Auditório Ribeira, 30 Janeiro, às 10 horas.
Natal – RN, Espaço RAMPA, 31 janeiro, às 19 horas.
Uma percepção histórica-crítica do documentário “Doutor Araguaia”

Professor Negreiros, Deuzimar Menezes
O documentário Doutor Araguaia, produzido e dirigido com maestria e modo poético por Edson Cabral, surge como uma contribuição significativa para a construção de uma memória histórica crítica no Brasil, ao alumiar a trajetória de João Carlos Haas Sobrinho, o “Juca”. O projeto, realizado com recursos da Lei Complementar nº 195/2022, demonstra o papel fundamental da cultura na preservação e valorização de narrativas históricas que, por muito tempo, foram silenciadas pelos interesses hegemônicos e autoritários vigente no Brasil.

A Trajetória de Juca e o Contexto da Guerrilha do Araguaia
João Carlos Haas Sobrinho, médico formado pela UFRGS e militante político, representa um dos muitos jovens idealistas que se engajaram na luta pela democracia e justiça social durante a ditadura militar no Brasil (1964–1985). Com uma sólida formação jesuíta e compromisso humanitário, ele não apenas atendeu populações marginalizadas na Amazônia Legal, mas também consolidou laços de confiança, respeito, admiração com os camponeses, fortalecendo a resistência contra um regime que concentrava a terra e o poder nas mãos de poucos. Fato que persiste nos dias atuais.

Sua morte na Guerrilha do Araguaia, em 1972, e o desaparecimento de seu corpo, fato que faz com que sua irmã Sonia Haas, com determinação heroica dedica sua vida à procura do corpo para um sepultamento como rito de nossa cultura, simbolizam a brutalidade do que é o regime militar que atua sistematicamente para apagar vestígios de sua repressão assassina. A Guerrilha do Araguaia, por sua vez, é um dos episódios mais sombrios e emblemáticos da repressão terrorista estatal, revelando a violência extrema, o terror que impunha contra opositores e populações, e a negação sistemática de direitos humanos básicos.
Resgate da Memória e o Papel do Documentário
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Desfile de 7 de Setembro no Maranhão homenageia combatentes da Guerrilha do Araguaia

Daniel Thame
O Desfile de 7 de Setembro em Porto Franco, no Maranhão, foi marcado por homenagens aos guerrilheiros do Araguaia, que lutaram contra a Ditadura Militar e foram massacrados pela repressão nos anos de 1972 a 1974.

Os estudantes do IEMA, Instituto de Educação do Maranhão, se preparam para o desfile celebrar a data da Independência, se debruçaram em recortes de jornais, livros, fotos antigas e escolheram o tema “Guerrilha do Araguaia e seus combatentes”.

Após várias entrevistas com moradores antigos, professores e estudantes definiram a melhor forma de contar a história do lugar e arredores dos rios Tocantins e Araguaia, com fotos e mensagens ilustrativas.

Em especial, chamou a atenção, uma ala com fotos de “Amigos do Dr João Carlos Haas”, médico gaúcho que viveu na cidade entre 1967 e 1968, deixando marcas profundas na memória de todos. “É muito emocionante ver este carinho, vivo até hoje, após 52 anos de morte de meu irmão.”, declara Sônia Haas, a irmã do médico, que hoje mantém uma relação de afeto com as moradores de Porto Franco.

Vale reforçar este empenho do IEMA em estimular brasileiros a contarem a história de seu país, com orgulho e sabedoria. A memória do período da ditadura militar no Brasil ainda precisa ser muito estudada e exposta pelo país inteiro.

Fica o exemplo, e que venham mais momentos de recordação e debate.
João Carlos Haas Sobrinho, Presente!

Sonia Haas
Era inverno, noite fria de São João.
24 de junho de 1941, nascia João Carlos Haas Sobrinho, na rua Primeiro de Março, em São Leopoldo.
Hoje, 83 anos de seu nascimento, celebro sua vida, com muito orgulho do ser humano bonito que ele foi, que ele é.
Até hoje seu nome faz lembrar a integridade, o profissionalismo e a solidariedade com que ele sempre se postou diante da vida.
Brindo por sua coragem, sua garra de viver e de pensar sempre no próximo, com amor e dedicação.
Esta cartinha veio de Porto Franco, escrita nos seus primeiros dias na região.
Lá em São Leopoldo, nós nem imaginávamos onde ele estava.
Era o ano de 1967 e ele já havia deixado o Rio Grande do Sul em janeiro de 1966.
Já li e reli esta cartinha dezenas de vezes, leio linhas, palavras, traços…interpreto a saudade e o afeto postos em letras.
Neste período tudo estava iniciando e aos poucos o João ficava mais distante de nós.
Longe daquele meu sonho de correr pro seu abraço, no próximo encontro.
Hoje, quando completa 83 anos de seu nascimento, só tenho a agradecer por sua vida, seu legado e pelas sementes plantadas.
As flores já se abriram e os frutos estão espalhados por aí.
P.S.: ele lembra da madrinha Olívia Linck e da Ema, que cuidava da nossa casa.
Ato Político reúne centenas em condenação ao golpismo e contra política de apaziguamento

Mais de 300 pessoas presenciaram o contundente ato Ato Político Nem esquecer, nem apaziguar: condenar o golpe militar ontem e hoje!, realizado pelo grupo A Nova Democracia, no dia 25 de abril, no Salão Nobre do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS) da UFRJ. No YouTube, por transmissão simultânea, centenas de pessoas assistiram, somando mais de 1 mil visualizações. O Ato remarcou a condenação aos golpistas e criminosos de guerra de 1964 e do regime militar que se seguiu, e demarcou contra a política de apaziguamento, exigindo a imediata reinstalação da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos do regime militar.

O diretor-geral e editor-chefe de AND, Victor C. Bellizia, sintetizou assim o Ato: “Este ato não é apenas uma contundente resposta ao golpismo. É isto também, porém é mais. Pensamos que aqui se demarca um campo político daqueles que se unificam na ideia de que é preciso barrar o crescimento e a ação da extrema-direita e do intervencionismo dos altos oficiais das Forças Armadas na vida política nacional”.
Ao longo de todo o evento, foram recolhidas dezenas de assinaturas de movimentos, entidades e personalidades presentes para a Moção Política Pela Reabertura da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos do regime militar.
Mesas discutiram o golpismo ontem e hoje
Setenta e cinco noites frias: João Carlos Haas Sobrinho
Sonia Haas
Rio Grande do Sul, São Leopoldo, 1941. Noite fria de São João. Nossa mãe, ansiosa, enfrentava a madrugada à espera da chegada do segundo filho.
Na rua Primeiro de março, número 514, a janela se entreabria e os raios da lua banhavam a sala pequena do sobrado dos Haas. Nosso pai, Ildefonso, católico que sempre foi, rezava para que a esposa Ilma Linck tivesse uma boa hora do parto. Contou-me ele, nos idos de 1980, quando conseguiu expor seus sentimentos em relação à história do filho desaparecido na ditadura, que nos primeiros momentos do ecoar do choro de João Carlos, uma luz forte entrou pela vidraça embaçada do quarto alertando: “Cuida bem deste teu filho, pois ele é especial.”
João Carlos foi um menino alegre, tinha no olhar o brilho da liderança. Jogava futebol, organizava festas, brincava com os animais, ajudava a mãe a cozinhar, escrevia poemas e artigos no jornal da escola – um aluno nota dez, cheio de medalhas no peito. Fez-se homem e seguiu firme em busca de seus ideais, atitude difícil para a família entender. João Carlos escolheu a Medicina e ao longo do curso percebeu que esta escolha poderia conduzi-lo a algo maior: dedicar sua vida ao próximo. E assim seguiu, se afastando das ruas de nossa cidade.
Ficamos nós, familiares e amigos, navegando em um vazio de obscuridade.
Em 1966 ele deixou o nosso convívio, rompeu os limites de seu horizonte e pisou firme nos trilhos de um novo mundo, onde o homem estaria no centro, como majestade, livre e forte. Assim ele quis, assim sonhou e lutou, até tombar em 1972, na região do Araguaia.
As noites de 24 de junho sempre foram frias, porém, para nossa família, após 1966, foram ficando gélidas, carregadas de saudade e tristeza.
Na infância da rua Primeiro de março, havia bandeirinhas e fogos na noite de São João: era a comemoração da vida. Recordo o profundo silêncio que ficou após termos ciência de seu desaparecimento, em 1979, 7 anos após a sua morte. Em cada canto da casa parecia haver uma oração a acalentar a esperança de que era tudo um sonho, não era verdade. Mas a realidade veio batendo à nossa porta aos poucos, a cada notícia: o reencontro não aconteceria.
Nossa mãe silenciava sua dor na tristeza do olhar, em todos estes aniversários passados. Até 2001, quando nos deixou, sempre fazia uma encomenda: “Já mandei rezar a missa para o João, vamos?”, com voz embargada me ligava sempre, a cada ano, numa nostalgia ritmada pelo vazio sem respostas.
24 de junho de 2016: 75 anos de nascimento de um amigo do povo que não mediu esforços para cumprir sua missão. Seu Ildefonso e Dona Ilma partiram sem poder sepultar o filho que tanto amaram. Talvez porque, na verdade, ele esteja mais vivo do que nunca, entre nós. Não só na memória dos que com ele conviveram, como também em tantas homenagens que vieram depois. João Carlos Haas Sobrinho: Presente!
Sônia Maria Haas é publicitária e irmã de João Carlos
Para João Carlos

Por Sonia Haas
“43 anos de desaparecimento
Este lugar carrega a tua história no seu próprio silencio, nas folhas paralisadas e nas raízes que invadem a terra.
O pó que vem do chão parece querer falar comigo, dizer o que não foi dito.
O Rio Araguaia baila com suas margens ao redor do tempo, e não nos deixa esquecer cada pedaço de vida que por ali ficou.
Cada raio de sol vem querer afagar meu rosto e dar o conforto que tanto espero.
E com esta saudade vou seguindo, carregando as histórias e juntando forças para lutar em honra aos nossos heróis, pela verdade e pela justiça.
JOÃO CARLOS HAAS SOBRINHO
* 24/06/1941 São Leopoldo-RS +30/09/1972 Xambioá Tocantins”
(*) Sonia é irmã de João, o Dr. Juca, um dos desaparecidos na Guerrilha do Araguaia, assassinado pela ditadura militar. O corpo do médico-guerrilheiro nunca foi encontrado.
Aos domingos, na esquina
Curta-metragem produzido por Sônia Maria Haas e integrante do filme colaborativo Um Golpe, 50 Olhares. O projeto organizado pelo grupo Criar Brasil e fomentado pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, por meio do Projeto Marcas da Memória, resgata a memória das vítimas e o horror da Ditadura Militar.
Sonia Haas é irmã do médico João Carlos Haas Sobrinho, o Dr. Juca, assassinado pelos militares durante a Guerrilha do Araguaia.












