Giorlando Lima

 

Já é 7 de dezembro, 2h30. Daqui a dez horas nascerei. Ao meio-dia e meia de uma quinta-feira como hoje, eu interrompo o almoço da minha mãe, de Mãe Nane, a parteira que me pegou e da vizinha que ajuda ela no meu parto; do meu pai que está lá fora e de um tanto de gente da família que espera pela notícia. O tempo está fechado, mas não chove. Faz um aquele calor típico do fim de primavera jacobinense. Não típico como este ano, senão eu já nasceria derretido. Nasci e chorei sem precisar de tapa no bumbum. Cheguei ao mundo para ser Giorlando (o mais velho do Brasil, hoje) e consegui. Eu, que já tive o apelido de Muruca e queria me chamar Ambrósio, santo do dia.

Desde então, já se passaram 62 anos. Naquele dezembro de 1961, a expectativa de vida ao nascer era de 53 anos. Meu lucro é de nove. E que lucro. Por isso eu comemoro. Tenho um corpo pesado com dores de um centenário, mas a minha cabeça não envelhece e o espírito se renova a cada dia. Se tenho medo de morrer? Eu me pelo que nem de medo de alma. Meu pai, que para mim era imortal, morreu aos 62. Era sagitariano, nascido em novembro. Por isso, vivo com a intensidade que me é possível, fazendo as coisas mais clichês do mundo: amando, buscando ser o melhor possível com as pessoas e fazer o mundo melhor, exercitando a gratidão, me divertindo e amando a mim mesmo.

O sete de dezembro não é o único dia muito feliz da minha vida, há datas superiores, como nascimento de filhos, aniversário da mãe, de Dulcy, o dia que sai o salário, mas nunca foi triste. Já teve um dia mais ou menos, quando completei o simbólico 50º aniversário. Eu brindei sozinho. Mas não fiquei triste. Este ano não está sendo tão feliz como no ano passado e o ano retrasado, nem como o ano em que Dulcy me levou para comer pizza na Della Mamma com o meu amigo Lucas que era dono da Pietri. Além deles dois, estavam meu irmão Ninca, os filhos delas, Thiago, com a namorada Avany, e João. Eu estava com a cara meio amarrada porque não gosto de festa surpresa (acho que não mereço), mas radiante por dentro como os torcedores do Bahia e do Vasco depois de se livrarem da degola, ontem.

Sei hoje que chegarão mensagens nas redes sociais e no WhatsApp que me alegrarão imensamente, às quais responderei, uma a uma (é a vantagem de ter poucos amigos, mas amigos que não esquecem da gente). Me lembro de quando esperava chegar esse dia para ver emocionado os cumprimentos dos amigos no meu Facebook. Como os primeiros que chegam nesta madrugada já me deixam emocionado como Zeca Baleiro quando recebeu um telegrama de Aracaju dizendo ‘nego, sinta-se feliz, porque no mundo tem alguém que diz que tanto muito te ama, que tanto te ama’.

Logo cedo, terei o abraço de Dulcy, a amada que me sustenta; os beijos à distância dos meus filhos Giorlandinho e Alice, o herói e a rainha da minha vida; as mensagens dos meus irmãos; ouvirei a voz carinhosa da minha mãe e terei o contato de alguns conhecidos e dos amigos queridos.

Mas, faltará alguém que me alegrou no ano passado e antes e antes e antes. E é por isso que este meu aniversário não está sendo feliz como outros. A minha irmã Tinha, a minha linda irmã que falava tão doce que me amava, não está mais aqui. Foi bem mais cedo que eu. Hoje, na minha fé carregada de dúvida, um desejo: que ela esteja passeando de mãos dadas com Deus e de lá sorrindo pelo meu renascimento.

Por que o que é um aniversário se não um nascer de novo? A idade de 61 eu completei ontem, hoje começo a de 62, com vontade continuada e intensa de viver. Como já disse, sentindo a idade nos joelhos, nos quadris, na pouca tonicidade dos bíceps, mas sem saber o que é isso na mente. Troco o ‘sem saber’, por sem ‘ligar para’.

A madrugada avança. Os olhos ardem pela luz amarelada do computador. Este é o único texto publicado neste BLOG desde segunda-feira e será assim por mais uns dias. Dei um tempo. Quero fazer a coisa certa, como venho tentando há 62 anos. Logo, as notícias e opiniões voltam. Por enquanto, aqui estou sendo eu a notícia, o foco do meu comentário, o objeto do meu artigo. Falando de mim e achando um momento para encaixar um sincero ‘muito obrigado’ a cada uma das pessoas que estiveram por perto nesses 22.645 dias da minha vida.

E mais ainda às que me permitiram participar um pouco das suas vidas e aprender com elas. E àquelas que aceitaram a minha partilha. E aos que leem o blog e mais ainda aos que elogiam. E para os que estarão comigo no ciclo que se inicia hoje, vocês verão sinais de que é um novo ciclo mesmo. E para as pessoas da minha família, meus amores. E para Deus, que me deu a vida e me permite a festa de viver.

Por tantos motivos, estou comemorando (porque não tem Botafogo certo para me entristecer só porque deu errado), só não vai ter festa. Obrigado, pessoas. Graças, Pai!