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Daniel Thame, jornalista no Sul da Bahia, com experiência em radio, tevê, jornal, assessoria de imprensa e marketing político danielthame@gmail.com

maio 2024
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:: ‘Torre de Babel’

Torre de Babel

Daniel Thame

daniel flicaDurante os tempos dadivosos, cada um se bastava, e o individualismo era a regra. Quem é que precisava de união, de organização, quando as terras, conquistadas por seus antepassados a ferro e fogo e deixadas esbanjando prosperidade e riqueza, geravam também a disputa para ver quem era o maior?

O título de maior produtor individual de cacau do mundo, coroa pousada em pouquíssimas cabeças, era uma espécie de troféu que, quando conquistado, equivalia à posse de um reino.

E pareciam mesmo reis os senhores que tudo podiam e de ninguém dependiam, a não ser do fruto dourado, da árvore mágica.

Não precisavam de governo nenhum e transformavam gerentes de banco em office boys subservientes e bajuladores. Nas crises cíclicas, pequenos hiatos na rotina de bonança, era o próprio dinheiro gerado pelo fruto quem garantia a recuperação, quem trazia de volta a prosperidade, num ciclo que não terminaria nunca.

Como não terminaria nunca, nunca se preocuparam com representação política, com entidades que fossem além dos almoços, jantares e viagens de puro deleite.

capa-do-livro-vassoura-daniel-thame-2A força de cada um dispensava a força coletiva, coisa de uns pobres coitados, de uns agitadores que vez por outra tentavam fazer com que os trabalhadores, que sempre ficaram com as migalhas do bolo doce e farto, se organizassem e reivindicassem seus direitos.

“Esses comunistas filhos da puta”, diziam com escárnio nas rodas de uísque escocês, correndo pelos copos como a água corre na cachoeira caudalosa.

Quando vieram os tempos difíceis, e esses tempos se revelaram mais longos do que a mais longa das crises enfrentadas até então, já não havia o dinheiro gerado pelo fruto, que a bruxa tratava de abortar ainda no ventre das árvores, igualmente agonizantes.

Cada um já não se bastava mais, a coroa de Rei do Cacau enferrujou tal qual um latão de péssima qualidade.

“Precisamos nos unir, cobrar das autoridades tudo aquilo que demos para o Estado, para a Nação”, bradava-se para auditórios suntuosos, mas vazios de gente e de alma.

Nas articulações, que nem esse nome justificavam, tão desarticuladas eram, ninguém se entendia, visto que como cada um sempre se fizera sozinho, sozinho falava a sua própria língua.

Instalou-se, então, uma confusa babel grapiúna, até que o templo em que eles se reuniam para celebrar as dádivas do deus cacau, em vez de ruir como era de se imaginar em tempos de ira divina, foi alugado, subalugado, emprestado, tomado.

E, finalmente, abandonado, como um monstrengo encalhado no coração da cidade.

Há quem jure ouvir, nas noites abafadas, vozes fantasmagóricas, mas que ninguém entende, posto que nessa Torre de Babel nem os fantasmas falam a mesma língua.

Conto extraído do livro “Vassoura, apogeu e queda da Região Cacaueira da Bahia”. Atualíssimo.





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