:: ‘fruto de ouro’
O fruto de ouro
Daniel Thame
Ouro, ouro, ouro…
Os gritos, abafados pela floresta, reverberavam nos ouvidos daquele homem aos farrapos, quase em transe.
Ouro, ouro, ouro…
Frutos de ouro.
As marcas da viagem estavam por todo o corpo. Os ferimentos eram como um mapa do trajeto insano, cruzando matas fechadas, desertos, rios caudalosos, picadas.
Uma viagem do fim do mundo ao fim do mundo.
Frutos de ouro.
Ouro, ouro, ouro…
Quando tomou, pela primeira vez, a bebida pastosa, de cor escura e sabor amargo, estava às portas da morte, abatido pela malária nos confins da selva amazônica. Para ele, o Eldorado escondido na mata impenetrável havia se tornado uma miragem.
Era apenas um moribundo, resgatado do delírio por índios que, a princípio, se assustaram com ele, mas depois se mostraram simpáticos.
Não era um espírito das trevas ou um invasor, mas um ser inofensivo, que falava uma língua que eles desconheciam e que mal conseguia se mover, tão debilitado estava.
Sobreviveu e, por algum motivo, achou que sua recuperação se devia à bebida escura, da qual os índios se serviam com reverência.
Uma noite, sonhou que as sementes que geravam o fruto do qual os índios produziam a bebida eram o Eldorado que ele tanto ansiava.
No sonho, um espírito, vestido com uma armadura de ouro, lhe dizia que ele encontraria, sim, o Eldorado através daquelas sementes.
Mas o espírito lhe sussurrou ao ouvido que o Eldorado não seria ali, naquela tribo onde os índios viviam a paz do isolamento e o verdadeiro ouro era a natureza e a fartura de comida.
Ouro, ouro, ouro…
Fruto de ouro.
Agora, depois da viagem rumo ao seu destino dourado, no solo sagrado do Sul da Bahia, aos pés de uma árvore frondosa, cuja copa parecia beijar o céu, ele agonizava enquanto sonhava com a bebida revigorante, capaz de devolver-lhe as forças perdidas.
Instintivamente, tirou da bolsa as sementes que guardara como se fosse o mais valioso dos tesouros, rasgou o chão com as poucas forças que lhe restavam e enterrou-as no solo, banhado com o suor que escorria do rosto e sangue que saía das mãos.
Era da cor de ouro o raio de sol que seus olhos viram ao olhar para o céu…
(conto extraído do livro Jorge100anosAmado-Tributo a um Eterno Menino Grapiuna Editora Via Litterarum)
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