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Daniel Thame, jornalista no Sul da Bahia, com experiência em radio, tevê, jornal, assessoria de imprensa e marketing político danielthame@gmail.com

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:: ‘Carta Maior’

A fúria dos que saíram do armário

Eric Nepomuceno, da Carta Maior

 

eric e chico cópiaO que mais impressiona – e preocupa – na agressão verbal que um grupo de garotões cuja profissão principal é ser filho de pai rico lançou contra Chico Buarque na noite da segunda-feira, 21 de dezembro? Três coisas. Primeiro, a extrema fúria dessa direita desgarrada que acaba de sair do armário embutido. Segundo, a facilidade com que repetem o que dizem os grandes meios de comunicação. E terceiro, a incapacidade para qualquer gesto minimamente civilizado.

Chico saía de um jantar com amigos quando, ao buscar um táxi, passou a ser chamado de ‘petista’. Ouviu a repetição de clichês idiotas repetidos à exaustão pelos meios de incomunicação e pelos deformadores de opinião. A um dos garotões ele respondeu com humor. Dizia o valentão que defender o PT quando se mora em Paris é fácil. ‘Você mora em Paris?’, perguntou Chico. E o rapaz respondeu: “Não, quem mora em Paris é você!’. Chico, então, perguntou: ‘Você andou lendo a Veja?’. A ironia continua sendo uma válvula de escape. Mas para ter ironia é preciso inteligência, artigo definitivamente raro na praça.

Não foi a primeira nem a décima agressão verbal que ele e seus amigos ouvem, todas relacionadas ao PT, a Lula e a Dilma. O mais recomendável é, sempre, fazer ouvidos moucos. Mas também essa regra tem suas exceções. O episódio de segunda-feira foi inevitável: Chico estava no meio da rua, é pessoa pública, reconhecível a milhas marítimas de distância.

chicoMais grave é saber que não foi a primeira nem a decima ocasião, e também não terá sido a última. O país está polarizado como poucas vezes esteve nos últimos 50 ou 60 anos. O grau de agressividade, de furiosa intransigência dessa direita recém-saída de um imenso armário – certamente embutido – é o que mais chama a atenção. E preocupa. Muito. Dizer na cara de alguém ‘Você é um merda’ pode ter consequências sérias. Chico sabia e sabe que qualquer reação à altura não faria outra coisa que atiçar ainda mais a fúria dessa direita desembestada, fartamente alimentada pela grande imprensa. Até nisso a direita recém assumida em sua verdadeira essência é covarde. Até quando?

O país se acostumou às tristes cenas de violência entre torcidas organizadas no futebol. Elas pelo menos têm a decência de se uniformizar, ou seja, é fácil identificar o adversário à distância.

Essa direita troglodita, não. Ataca à traição. E sabe que figuras públicas como as que foram atacadas à sorrelfa não costumam reagir, para não alimentar a sede mesquinha dos escrevedores de intrigas.

Há poucos registros, que eu me lembre, de alguém que tenha saído do armário com tanta sede de ação. Cuidado com eles: tantas ganas reprimidas, quando subitamente liberadas, desconhecem limites.

Ronaldo e a vergonha de um sem vergonha

Antonio Lassance (*)

Carta Maior

ronaldo 2Ronaldo foi um fenômeno do futebol e é, até hoje, um fenômeno na arte de ganhar dinheiro. É difícil atravessar um intervalo comercial sem ver sua cara e ouvir sua voz vendendo alguma coisa. Desde que se aposentou dos gramados, sua fortuna cresce alimentada por sua boca.

Cada frase de Ronaldo vale ouro e é ensaiada para render dividendos para algum patrocinador.

Por isso, não custa nada perguntar o que Ronaldo ganha com sua declaração de que está envergonhado com os preparativos da Copa.

A pergunta precisa ser feita, pois a declaração acabrunhada é estranha. Vem não só de alguém que, até então, era só elogios e otimismo. Vem de quem é do Conselho de Administração do Comitê Organizador Local da Copa.

Faltando poucos dias para o início da competição, o que devemos achar de quem resolve, simplesmente, lavar as mãos e fingir que não tem nada a ver com a coisa?

A vergonha de Ronaldo tem o efeito bumerangue sobre sua própria imagem, pois mostra alguém que, como se diz no jargão do futebol, “pipocou”, fugiu da bola dividida. Alguém que deveria ter usado seu prestígio, desde o início, para ser parte da solução, preferiu tirar o corpo fora e ser parte do problema.

Como organizador, Ronaldo poderia ter dedicado seu tempo a ajudar a que algumas coisas ganhassem mais atenção. Preferiu gastá-lo gravando anúncios publicitários.

Enquanto era tempo, poderia ter pedido mais empenho e rapidez nas obras, tanto as dos estádios quanto as de mobilidade – por que não?

Poderia ter pedido paz às torcidas e aos manifestantes. Preferiu posar com um terno dourado no Carnaval e, depois, envergonhar-se.

Os preparativos para a Copa já estiveram por um triz, em vários momentos e sob vários aspectos. Ronaldo poderia ter dito, com muita antecedência, por exemplo, que se sentia envergonhado com o abandono a que a Arena da Baixada foi submetida pelo governador do Paraná e pelo prefeito de Curitiba.

De todas, foi a situação mais absurda e que quase comprometeu uma cidade como sede. Ronaldo nunca esteve entre os que correram atrás para cobrar providências, e nem para se mostrar envergonhado. Nenhuma declaraçãozinha.

Também não expressou qualquer sentimento, indignado ou envergonhado, quando da morte do torcedor atingido por uma latrina, no estádio Recife, em uma briga de torcida.

Nada disso. Ronaldo esperou os estádios serem construídos e entregues, os ingressos serem vendidos, as seleções serem convocadas; esperou ter feito todas as propagandas possíveis e imagináveis que poderia para esta Copa. Só então se fez de envergonhado.

Há quem diga que o sincericídio de Ronaldo tem a ver com o fato de que, no mesmo dia, declarou apoio à candidatura de Aécio Neves.

Difícil acreditar que ele, que hoje vive de emprestar sua imagem a vender produtos, esteja entrando nessa, ao lado de Aécio, por pura convicção, e não como garoto propaganda.

Sua vergonha não transpira nada de autêntica. Parece ensaiada e feita sob medida para um comercial, como aqueles com textos decorados e de péssima interpretação, em que o “Fenômeno” vende carros da Fiat, chuteiras da Nike e planos de telefonia da Claro.

Ronaldo, com vergonha ou sem vergonha, é a mesma pessoa. É aquele que vemos todos os dias na tevê e nos outdoors.

Já faz tempo que esse é o mundo do “Fenômeno”. Não tem mais nada a ver com  futebol, nem com indignação, nem com um pingo de vergonha.

 

(*) Antonio Lassance é cientista político

 

 

 

 

CHE GUEVARA E OS MORTOS QUE NUNCA MORREM

 No dia em que executaram o Che Guevara em La Higuera, uma aldeola perdida nos confins da Bolívia, Julio Cortázar – que na época trabalhava como tradutor na Unesco – estava em Argel. Naquele tempo – 9 de outubro de 1967 – as notícias demoravam muito mais que hoje para andar pelo mundo, e mais ainda para ir de La Higuera a Argel.

Vinte dias depois, já de volta a Paris, onde vivia, Cortázar escreveu uma carta ao poeta cubano Roberto Fernández Retamar contando o que sentia: “Deixei os dias passarem como num pesadelo, comprando um jornal atrás do outro, sem querer me convencer, olhando essas fotos que todos nós olhamos, lendo as mesmas palavras e entrando, uma hora atrás da outra, no mais duro conformismo… A verdade é que escrever hoje, e diante disso, me parece a mais banal das artes, uma espécie de refúgio, de quase dissimulação, a substituição do insubstituível. O Che morreu, e não me resta mais do que o silêncio”.

Mas escreveu:

Yo tuve un hermano
que iba por los montes
mientras yo dormía.
Lo quise a mi modo,
le tomé su voz
libre como el agua,
caminé de a ratos
cerca de su sombra.
No nos vimos nunca
pero no importaba,
mi hermano despierto
mientras yo dormía,
mi hermano mostrándome
detrás de la noche
su estrella elegida.

A ansiedade de Cortázar, a angústia de saber que não havia outra saída a não ser aceitar a verdade, a neblina do pesadelo do qual ninguém conseguia despertar e sair, tudo isso se repetiu, naquele 9 de outubro de 1967, por gente espalhada pelo mundo afora – gente que, como ele, nunca havia conhecido o Che.

Passados exatos 44 anos da tarde em que o Che foi morto, o que me vem à memória são as palavras de Cortázar, o poema que recordo em sua voz grave e definitiva: “Eu tive um irmão, não nos encontramos nunca mas não importava, meu irmão desperto enquanto eu dormia, meu irmão me mostrando atrás da noite sua estrela escolhida”.

No dia anterior, 8 de outubro de 1967, um Ernesto Guevara magro, maltratado, isolado do mundo e da vida, com uma perna ferida por uma bala e carregando uma arma travada, se rendeu. Parecia um mendigo, um peregrino dos próprios sonhos, estava magro, a magreza estranha dos místicos e dos desamparados. Foi levado para um casebre onde funcionava a escola rural de La Higuera. No dia seguinte foi interrogado. Primeiro, por um tenente boliviano chamado Andrés Selich. Depois, por um coronel, também boliviano, chamado Joaquín Zenteno Anaya, e por um cubano chamado Félix Rodríguez, agente da CIA. Veio, então, a ordem final: o general René Barrientos, presidente da Bolívia, mandou liquidar o assunto.

O escolhido para executá-la foi um soldadinho chamado Mario Terán. A instrução final: não atirar no rosto. Só do pescoço para baixo. Primeiro o soldadinho acertou braços e pernas do Che. Depois, o peito. O último dos onze disparos foi dado à uma e dez da tarde daquela segunda-feira, 9 de outubro de 1967. Quatro meses e 16 dias antes, o Che havia cumprido 39 anos de idade. Sua última imagem: o corpo magro, estendido no tanque de lavar roupa de um casebre miserável de uma aldeola miserável de um país miserável da América Latina. Seu rosto definitivo, seus olhos abertos – olhando para um futuro que ele sonhou, mas não veria, olhando para cada um de nós. Seus olhos abertos para sempre.

Quarenta e quatro anos depois daquela segunda-feira, o homem novo sonhado por ele não aconteceu. Suas idéias teriam cabida no mundo de hoje? Como ele veria o que aconteceu e acontece? O que teria sido dele ao saber que se transformou numa espécie de ícone de sonhos românticos que perderam seu lugar? Haveria lugar para o Che Guevara nesse mundo que parece se esfarelar, mas ainda assim persiste, insiste em acreditar num futuro de justiça e harmonia? Um lugar para ele nesses tempos de avareza, cobiça, egoísmo?

Deveria haver. Deve haver. O Che virou um ícone banalizado, um rosto belo estampado em camisetas. Mas ele saberia, ele sabe, que foi muito mais do que isso. O que havia, o que há por trás desse rosto? Essa, a pergunta que prevalece.

O Che viveu uma vida breve. Passaram-se mais anos da sua morte do que os anos da vida que coube a ele viver. E a pergunta continua, persistente e teimosa como ele soube ser. Como seria o Che Guevara nesses nossos dias de espanto? Pois teria sabido mudar algumas idéias sem mudar um milímetro de seus princípios.

Diz Eduardo Galeano, que conheceu o Che Guevara: ele foi um homem que disse exatamente o que pensava, e que viveu exatamente o que dizia.

Assim seria ele hoje.

Já não há tantos homens talhados nessa madeira. Aliás, já não há tanto dessa madeira no mundo. Mas há os mortos que nunca morrem. Como o Che.

E, dos mortos que nunca morrem, é preciso honrar a memória, merecer seu legado, saber entendê-lo. Não nas camisetas: nos sonhos, nas esperanças, nas certezas. Para que eles não morram jamais. Como o Che.

Texto de Eric Nepomuceno/ Carta Maior





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