Mestre Virgilio (1)

O Conselho Universitário da Universidade Estadual de Santa Cruz (Consu/Uesc) reúne-se, extraordinariamente, às 14 horas desta segunda-feira (23), para entregar o título de Doutor Honoris Causa a José Virgílio dos Santos, “Mestre Virgílio”. A solenidade terá lugar no Auditório do Centro de Arte e Cultura da Uesc. Será a primeira reunião presencial desde o início da pandemia ocasionada pelo Covid-19. Por essa razão, apenas cem pessoas poderão participar presencialmente da solenidade.

Mestre Virgilio (2)O título de Doutor Honoris Causa foi concedido por unanimidade, na 53ª reunião (on-line) do Consu, realizada no dia 4 de agosto de 2020, proposto pela professora Camila Righetto Cassano, do Departamento de Ciências Biológicas (DCB/Uesc), e recebeu o parecer do professor Sanqueilo de Lima Santos, do Departamento de Filosofia e Ciências Humanas (DFCH/Uesc).

“Virgílio figura entre os mestres de Capoeira Angola mais antigos permanecendo em atividade e é único por sua história desvinculada da região de Salvador e Recôncavo. A trajetória de vida e resistência, suas produções artísticas, o apoio e incentivo a grupos de capoeira e a manutenção da tradição da Capoeira Angola em sua linhagem demonstram o saber e o fazer de Mestre Virgílio em prol da cultura afro-brasileira, tendo a cidade de Ilhéus como ponto de origem. Tais atributos conferem ao Mestre Virgílio, as qualidades que justificam a concessão do título de Doutor Honoris Causa pela Universidade Estadual de Santa Cruz. Esse título se destina à personalidade que se tenha distinguido pelo saber ou atuação em prol das Artes, das Ciências, da Filosofia, das Letras ou de melhor entendimento entre os povos,” destaca o parecerista.

“Honoris Causa” é uma expressão latina que significa “por causa de honra” e é utilizada quando uma universidade deseja conceder um título de honra para uma personalidade de grande destaque ou importância por seu trabalho.

Para o reitor da Universidade Estadual de Santa Cruz, professor Dr. Alessandro Fernandes de Santana “mais que isso. A nossa Universidade está maior do que ela é. Neste momento, em que no Brasil e no mundo, ressoam atitudes de intolerância, preconceitos, sufoca-se a cultura, tentam desconstruir tradições e, com isso, os valores materiais e imateriais, o seu Conselho Universitário, vai se reunir extraordinariamente para entregar o título Doutor Honoris Causa ao Mestre Virgílio. Mestre, porque fez do seu modus vivendi a sua tese e a defende na academia da vida, distribuindo saberes, valorizando a vida e ensinando a paz”.

Na opinião da professora Camila Righetto Cassano, autora da proposição, “esse título é o reconhecimento dos valores da cultura afro-brasileira e, em especial, o valor cultural da Capoeira. É o reconhecimento a uma pessoa que fez da sua vida um grande terreiro, onde pôde passar a todos, sem distinção, os seus conhecimentos. Por extensão, esse título reconhece os muitos mestres de capoeira que continuam esquecidos e pouco valorizados enquanto mantenedores de uma cultura que atravessou séculos de resistência à escravidão e discriminação”.

 

A Vida de um Mestre

O resumo do curriculum vitae de José Virgílio dos Santos e justificativa do pleito pelo DCB, dada a riqueza da sua historia de vida:

1934 – Nasce José Virgílio dos Santos, em Ilhéus (BA);

1943 – Em tempos de marginalização da capoeira, inicia-se na capoeiragem com o apoio da avó materna;

1955 – Depois de realizar diversos serviços no porto foi contratado como Contramestre;

1957 – Associou-se ao sindicato;

1971 – Quando as alvarengas pararam de funcionar, passou a trabalhar como classificador de cacau e em empilhadeiras;

1956-7 – Organizavam-se rodas de capoeira no ponto da lancha em Ilhéus; João Grande estava em Ilhéus;

Década de 60 – Zequinha organizava rodas e a capoeira passou a fazer parte da vida cotidiana de Mestre Virgílio;

1982/1994 – Aposentou-se como classificador de cacau, mas trabalhou até 1994 com empilhadeiras;

1990 – Mestre Virgílio iniciou o seu primeiro grupo, o “Gêge Nagô”, ministrando aulas regulares de capoeira;

Anos finais de 90 – Mestre Virgílio é “descoberto” pela capoeira Angola e encontra com o, então, famoso Mestre Jogo de Dentro;

2000 – O grupo liderado por mestre Virgílio passa a se chamar Mucumbo;

Mestre Virgílio, junto com outros companheiros de capoeira, inicia o movimento de confraternização entre capoeiristas, intitulado “Roda de Paz”;

2004 – Aulas regulares de capoeira são realizadas em Olivença com oficina de fabricação de berimbau;

2006 e 2007 – Aulas de capoeira no Teatro Municipal;

Encontro com o Capoeira João Grande na Roda de Paz de 2007;

Com o posterior fechamento do Teatro, as aulas de capoeira passaram a ser realizadas na Casa dos Artistas e depois transferidas para o Terreiro Matamba Tombeci Neto;

O Grupo Mucumbo continua com as suas atividades semanais no espaço Bloco Afro-Dilazenze ligado ao Terreiro Matamba Tombeci Neto;

2008 – A Associação de Capoeira Angola Mucumbo é reconhecida pela Câmara de Vereadores de Ilhéus como entidade de utilidade pública;

2013 – Estabelece-se parceria da Associação de Capoeira Mucumbo com a Tenda do Teatro Popular, visando à realização de treinos semanais como parte das atividades do evento intitulado “Chamada de Angola”;

O “Chamada de Angola” realiza também eventos anuais com o apoio e participação de Mestres da Bahia e do Exterior;

2016 – Desde 2016, às sextas-feiras, o Mestre Virgílio realiza rodas abertas ao público em sala da Biblioteca Municipal Adonias Filho, em Ilhéus;

2019 – Aos 85 anos, Mestre Virgílio continua realizando as suas atividades na Associação de Capoeira Angola Mucumbo.