:: ‘Herança Digital’
A destinação do patrimônio virtual em caso de morte ou incapacidade do usuário: herança digital
Debora Spagnol
No longa “Violação de Privacidade”, o magnífico Robin Williams interpreta um montador de filmes que são produzidos por chips inseridos no cérebro das pessoas antes de seu nascimento e que registram os fatos ocorridos durante toda a sua vida (emoções, situações, vivências). Após a morte, o mecanismo é retirado e o material nele existente é transformado em filme que, editado, retrata apenas os momentos positivos e marcantes do falecido, omitindo-se os fatos obscuros e absolvendo-o (virtualmente) dos pecados cometidos. Em seguida, numa cerimônia especial as “rememórias” são exibidas a familiares e amigos do morto numa homenagem falsificada criada por terceiro para transmitir aos sobreviventes apenas o que preserva a imagem com a qual o “de cujus” gostaria de ser lembrado.
Se na ficção já é possível selecionar e preservar determinadas situações vividas por alguém após sua morte, divulgando apenas o que não interfere na imagem social (afinal, todos assumimos uma persona para sobreviver socialmente, segundo Carl Jung), na vida real e no que se refere aos aspectos virtuais isso também já se mostra possível. (1)
Vivemos a era da “digitalização das relações sociais”: as interações profissionais, familiares, amorosas e de amizade se tornam a cada dia mais virtuais, concentrando nas redes sociais e “nuvens” não apenas as lembranças, fotos, músicas, filmes e livros mas também documentos, e-mails, senhas e códigos bancários, contratos eletrônicos e sistemas.
Essa exposição diária gera uma infinidade de situações pessoais e profissionais, formando um gigantesco patrimônio digital, com ou sem valor econômico, mas que constitui propriedade do usuário e que resulta em direitos e deveres relativos a esse novo mundo que se estabelece.
A evolução e mudança nas relações sociais geradas pela internet necessitam do direito uma resposta ágil às suposições e questionamentos sobre os fatos, possibilitando assim antever possíveis conflitos originários dessas interações.
Se considerarmos que “a vida digital tem vida própria, ou seja, sua existência online irá sobreviver a você” (2), é possível prever problemas patrimoniais, criminais e relativos à sucessão quando ocorrer a morte ou incapacidade do usuário virtual. Especificamente com relação à sucessão patrimonial, surge então o seguinte questionamento: qual destino será dado ao seu patrimônio digital quando ocorrer a sua morte ?
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