A0 PÉ DA GOIABEIRA lopes

Fiquemos no exercício da ficção, já que a realidade nos aflige. Como o governo do Capitão reformado, ao que tudo indica, já terminou (espécie de realismo fantástico, pois tem fim sem ter começo!), façamos com ele não um necrológio decente, que ele não merece, mas aquilo que a velha mídia pouco imaginativa faz a cada final de ano: uma retrospectiva. Vamos a alguns episódios, sem graduá-los em importância ou data, todos comprometedores da decência nacional:

 

RepúblicaDurante a campanha, o então juiz Sérgio Moro, elevado pela classe média conservadora a guardião da lei e da ordem no Brasil, além de paladino da moral e dos bons costumes políticos nacionais, interrompeu as férias e voltou ao tribunal, para julgar um recurso de Lula.

 

Nesse período, os robôs a serviço do Capitão reformado destampam as redes sociais e de lá emerge uma lama fervente e malcheirosa que se espalha pelo País, tendo como mote o kit gay e a mamadeira erótica que o PT reservara para as crianças em idade escolar. O eleitores passam a conviver com mais um anglicismo: fake News, a mentira com nome sofisticado, base  do discurso de ódio que se espraiou pelas terras de Cabral (o Pedro, não o Sérgio.

 

A eleição, marcada para 7 de outubro, foi decidida um mês antes, no dia 6 de setembro, com uma facada mal aplicada (e mal explicada) no candidato dos evangélicos fundamentalistas, militares, milicianos e “baleiros”. Um doido chamado Adélio Bispo de Oliveira entrou na história como o mais influente eleitor de todos os tempos.

 

Apurados os votos, o Capitão reformado reuniu um grupo de seguidores, à frente os pastores Malafaia e Malta, promovendo um ato religioso típico de países do Oriente Médio, como se o Capitão reformado fosse o aiatolá  Khomeini  e não fosse o Brasil um Estado Laico.

 

 

Dias antes da posse, o eleito das elites brasileiras bateu um recorde negativo, dentre muitos que se seguiriam: criou uma crise, antes de receber a faixa – ao falar um amontoado de bobagens sobre Cuba. Resultado? Os médicos cubanos deixaram o Brasil e, até hoje, algumas comunidades (a exemplo de Melgaço/PA – o mais baixo IDH do País) estão sem a minimamente adequada assistência médica.

 

Em 10 de outubro, o Capitão reformado visitou os EUA e prestou continência à bandeira do país, num ato de explícita subserviência. Em 29 de novembro, presta continência a John Bolton um assessor do governo dos Estados Unidos, o que fez viralizar na interrnet o comentário maldoso de que o presidente do Brasil era capaz de prestar continência até à logomarca das Lojas Americanas.

 

Naquele outubro (dia 21), o filho-deputado federal, numa pregação de golpe ao estilo dessa gente, ameaçou fechar o STF: “Não manda nem um jeep. Manda um soldado e um cabo, não desmerecendo o soldado e o cabo…!” – disse o filho do Capitão. O STF, normalmente muito sensível, absorveu o insulto, em ensurdecedor silêncio.

 

Ainda em outubro, o filho-senador, dito “chanceler informal” do Brasil, passou a usar um boné da campanha “Trump 2020”

 

Por fim, o homem toma posse, com seu filho-vereador rompendo o protocolo, refastelado no carro presidencial, numa antecipação do que ele e os outros “garotos” seriam capazes de fazer nos tempos que viriam.

 

Empossado, ele passa a detalhar seu plano de maldades: nomeia ministra dos direitos humanos uma pastora que, logo em seguida, se fez famosa por uma estranha conversa com Jesus Cristo, no alto de uma goiabeira; o Capitão reformado anuncia que o agro negócio iria administrar as terras dos índios, mas, pressionado, desiste da maluquice.

 

Em seguida, Murilo Rezende, diretor do Inep (responsável pelo Enem), declarou-se favorável a uma “queima lúdica” dos livros de Rodrigo Constantino (um blogueiro de direita) e Vasques da Cunha (escritor, autor de A Poeira da Glória/Record, que sustenta serem os intelectuais brasileiros todos estúpidos, incluindo ele).

 

Em 26 de fevereiro, este Barão foi aclamado (à boca pequena, é verdade) presidente do Brasil, tendo como plataforma de governo “acabar com a pouca vergonha que se instalou em Brasília”; no mesmo dia, o ator José de Abreu se lançou à Presidência, e o Barão, sacrificando seus interesses no altar da Pátria – e com medo de enfrentar o poderio da Globo, renunciou, contentando-se com o rendoso cargo de ex-presidente autoproclamado do Brasil. Fui presidente por algumas horas, o que, certamente me dá direito a aposentadoria proporcional.

 

Enfim, para não gastar vela boa com defunto ruim, não detalhamos todas as trapalhadas do clã presidencial, apenas algumas das mais gritantes (e vergonhosas para a soberania do País).

 

Ficam o patriótico leitor e a sensível leitora convidados a aumentar a lista dos fatos e pessoas que definem a era do clã Bolsonaro e seguidores, a exemplo do mote carnavalesco  “Hei, Bolsonaro! VTNC!”, as manifestações das escolas de samba,  Queiroz diretor-financeiro do laranjal, a deputada Joyce Não-Sei-das-Quantas (especialista em fake News e pregação de golpe), o buzinaço em comemoração ao incêndio numa favela de São Paulo, o regozijo de uma menina pelo assassinato de Marielle  Franco, as homenagens a milicianos, o ataque de bolsonaristas raivosos a Dilma Rousseff no aeroporto de Madri, Janaína Paschoal (a desmiolada Musa do Golpe de 2016), o depósito bancário na conta da primeira-dama, elogios a Pinochet pelo “banho de sangue” que deu no Chile, ordem para comemorar o aniversário do golpe militar de 1964, plano de  invadir a “nossa” Venezuela, nação sob o olhar de russos e estadunidenses – o que fará do Brasil o marisco na luta dos rochedos, e não deixem de incluir o golden shower, popularizado pelo Capitão reformado.

 

Se você discorda de que este governo já acabou e não deixou saudade, ou morreu e esqueceu de cair, queixe-se ao editor Daniel Thame.

 

bddepd@gmail.com       –       Barão de Pau d´Alho

 

 

PERFIL DO BARÃO

Todos mostram seu perfil, também vou mostrar o meu. Chamo-me Marcos Aparício Lins Machado de Guimarães Rosa, e, logo se percebe, não sou propriamente uma pessoa, mas uma homenagem: cada um desses nomes tem um significado para mim, mas não vou tirar de ninguém – se não o prazer, ao menos o exercício de identificá-los.

Atendo também por Barão de Pau d´Alho (e isto tem a ver com o cheiro de minha terra – aí uma pista para pesquisadores ociosos). Sou um jornalista modesto, se é que isto existe, pois escolhi esse título honorífico de menor impacto, quando bem me poderia autoproclamar Marquês da Cocada Preta, Conde de Macuco ou Duque Sei-Lá-do-Quê.  A propósito, os títulos de nobreza (tiremos daí os reis e príncipes, gente de outra classe) são, em ordem decrescente de importância, duque, marquês, conde, visconde e barão, caso não me engana e a história – e ao dizer isto já denuncio este como um espaço dedicado à informação…

Apesar do velho adágio “nobreza obriga”, não sou muito de frequentar as ditas rodas sociais, muitas vezes parecidas com rodas da malandragem: vivo um tanto isolado do lufa-lufa da cidade, envolvido com meus livros, um tabuleiro de xadrez e uns discos de jazz e MPB. Quando acometido da fadiga do tédio, ou se quero sofrer um pouco, ligo a tevê, assisto a um noticiário, registro um monte de agressões à língua portuguesa, me canso e retorno à  rotina. Novela, não vejo nunca, pois meu masoquismo ainda não chegou a tais extremos. Nada de telefone nem zap-zap, não sei bem o que é rede social, para  mim rede é aquela coisa que os pobres do Nordeste usam em substituição à cama, e que os ricos têm nas casas de praia.

Procuramos fazer aqui, semanalmente, uma coluna, erguida com  as coisas que nos derem na telha, deixando a eventuais leitores espaço para os devidos xingamentos, pois vivemos, formalmente, em regime democrático. Diga-se ainda que, por se tratar de um espaço politico-ecológico, escolhi para musa da coluna aquela moça chegada a encontros religiosos em altos de goiabeiras – e de cujo nome, graças a Deus, já esqueci.