Débora Spagnol

debora 2Pesquisas do IBGE informam que, no período de uma década, cresceu em 35% o número de mulheres que se casaram com homens mais jovens, enquanto a quantidade de homens mais velhos que se casaram com mulheres mais jovens aumentou apenas 25,3%. O mesmo ocorreu com as uniões estáveis.

Ainda segundo as estatísticas, nos relacionamentos mulheres mais velhas x homens mais novos, quanto maior for a diferença de idade maior será a diferença de salário, em desfavor dos homens. De forma geral, a pesquisa demonstra que a passagem do tempo somente faz bem às mulheres: há aumento dos benefícios a níveis sociais, financeiros e culturais.

Independentemente do sexo, o casamento entre parceiros com grande diferença de idade já é praxe e analisar essas relações como interesseiras é uma forma injusta e preconceituosa, além de um insulto à inteligência por quem optou por este tipo de relacionamento.

A paixão, mesmo que embote os sentidos, não pode ser motivo de renúncia à capacidade de discernimento dos parceiros, que tem à sua disposição formas legais e seguras de fixar os regimes de casamento e contratos que regerão a vida financeira do casal.

Nosso legislador sempre se preocupou em preservar o patrimônio de homens e mulheres que adentram na maturidade e que podem estar mais suscetíveis à malícia de quem busque a relação com finalidade exclusivamente patrimonial, incentivando assim as uniões com base principalmente no afeto.

Em tempos passados, os códigos de leis previam a proibição de alienação de parcela do patrimônio e incomunicabilidade de bens, com obrigatoriedade do regime dotal (com o marido administrando o dote recebido da família da esposa).

Hoje, o regime obrigatório ao casamento de pessoas maiores de 70 anos, seja homem ou mulher, é o de separação total de bens: a cada um caberá o patrimônio próprio que tinha ao constituir a união, sem comunicar-se com os do outro cônjuge. Porém nada impede que o maduro casadoiro casado pelo regime da separação legal realize atos de liberalidade, transferindo determinados bens ao outro cônjuge, por doação ou testamento.

A adoção do regime obrigatório de separação de bens se dá através da formalização de um pacto antenupcial (ou pré-nupcial) firmado antes do casamento.

Como o regime de separação de bens está restrito ao casamento, quando o casal opta pela união estável a situação é diferente. Caso a união seja desfeita, cabe a cada parceiro o direito à metade dos bens adquiridos na constância do relacionamento – mesmo que uma das partes não tenha contribuído financeiramente para adquiri-los. Como prevenção, o casal pode firmar um documento estabelecendo quais bens pertencem a quem, no momento da união. Os novos bens que forem adquiridos deverão ser incluídos no documento, firmado em cartório.

Na tentativa de beneficiar-se em detrimento do ex-companheiro em casos de rompimento, alguns se utilizam da tática de transferir o patrimônio para os filhos ou outros parentes. Ocorre que, se em eventual ação judicial restar comprovado que esse patrimônio foi adquirido durante o relacionamento, as doações poderão ser anuladas pelo Juiz, dividindo-se o patrimônio entre o casal.

Porém, pergunta-se: poderia o Estado, sob o argumento protetivo, interferir na liberdade e autonomia das pessoas de idade mais avançada, impondo o regime de bens ao casamento por elas contraído ? Qual o limite considerado viável à atuação do Estado na vida privada dos casais ?

Ora, a autonomia da vontade, sob a lição de Flávio Tartuce, “não existe apenas em sede contratual ou obrigacional, mas também em sede familiar. Quando escolhemos, na escalada do afeto, com quem ficar, com quem namorar, com quem ter uma união estável ou com quem casar, estamos falando em autonomia privada, obviamente.”

Assim, se evoluímos a ponto de poder escolher a forma de vida amorosa, sexual e social que desejamos vivenciar, não é justo supor que alguém plenamente capaz para todos os exercícios da vida civil, especialmente nos dias de hoje, seja incapaz de decidir o regime que regerá sua união patrimonial. A intervenção do Estado, assim, seria inconstitucional por ferir a liberdade individual e a dignidade da pessoa humana, pois presumiria a incapacidade do destinatário.

A norma restritiva, porém, encontra vários defensores. Argumentam que, embora se considere que as pessoas de idade alta ou avançada não estão destituídas de impulsos afetivos e da possibilidade de sentirem amor, ternura e pretendam uniões baseadas exclusivamente no afeto, é razoável supor que uniões somente afetivas entre pessoas com grandes diferenças de idade sejam honrosas exceções. A proteção da lei funcionaria, assim, como um estimulador do afastamento do conteúdo patrimonial do casamento e reforço de outros atributos que lhe são inerentes, como a comunhão de vida, a formação da família e o desenvolvimento do afeto. (1)

 

Referências:

1 – BARRUFINI, Frederico Liserre. In: “Aspectos patrimoniais do casamento do maior de 60 anos – Antes e depois do novo Código Civil”. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=5092.  Acesso em janeiro/2017

2 – TARTUCE, Flavio. “Novos princípios do direito de família brasileiro”. p.45