Efson Lima

 

efsonPoucos sabem, mas a Academia Brasileira de Letras teve a participação de uma mulher na sua concepção, contribuindo para o nascimento do sodalício. Trata-se de Júlia Lopes de Almeida (1862-1934), ela foi indicada por Lúcio de Mendonça, um dos idealizadores da Academia Brasileira de Letras, para compor o quadro de fundadores. Entretanto, a sugestão não se confirmou. Era mulher e como mulher, entendia-se que não podia fazer parte do clube literário, então, decidiu-se pela participação do esposo.

 

A invisibilidade feminina parecia ser regra. Mas, em 06 de agosto de 1977, pela primeira vez, uma mulher foi eleita para pertencer ao quadro da Academia Brasileira de Letras, Rachel de Queiroz, projetando-a ainda mais no cenário nacional e possibilitando seus textos alcançarem um maior número de leitores.  Outras mulheres foram eleitas para o panteão da imortalidade literária brasileira: Dinah de Silveira de Queiroz; Nélida Piñon, que se tornou a primeira mulher a presidir a ABL, coincidentemente, no período do centenário; Lygia Fagundes Telles; Zélia Gattai; Ana Maria Machado; Cleonice Berardinelli; e a última a ser eleita para fazer parte do silogeu foi Rosiska Darcy de Oliveira em 2012. Portanto, até então, tivemos somente oito mulheres na ABL.

 

janeNa Bahia, a presença feminina foi registrada vinte um ano depois de fundada a Academia de Letras da Bahia, em 1938, com Edith Mendes da Gama Abreu. Muito tempo depois, marcando novo momento, a imortal Evelina Hoisel tomava posse, em 09 de abril de 2015, como primeira mulher presidente da Academia de Letras da Bahia, coincidentemente, como na Brasileira, na gestão de Hoisel foi comemorado o centenário da Casa de Arlindo Fragoso.  Em 2015, a Academia registrava oito mulheres. A presidência de Evelina chegou ao fim em março de 2019, quando a presidência do clube literário foi passada ao imortal Joaci Góes.

 

No interior da Bahia, precisamente, na Academia de Letras de Ilhéus, a presença feminina foi registrada pela primeira vez em 1984, naquele ano, Janete Badaró  (foto) foi eleita para a cadeira n.º 6. “Elas estão chegando”, Francolino Neto, um dos membros ativos da vida da Academia, assim prenunciava.  Foi essa advogada que mudou o curso da história do sodalício, tornando-se a primeira mulher a ingressar na ALI, demarcando novo momento no panorama literário da nação grapiúna. Em outro momento, tive a oportunidade de afirmar que Janete Badaró foi a nossa Rachel de Queiroz nas terras grapiúnas. Dois livros de sua autoria denotam a caminhada literária da mulher que ousou a ingressar em um espaço ocupado por homens.   É importante registrar a ativa atuação dela na fundação da “Ilhéus Revista” e os trabalhos desenvolvidos nesse periódico, consolidando assim a atuação literária da primeira imortal mulher na ALI.

academia de letras de ilheusA acadêmica Maria Schaun, de forma esquematizada, tem registrada a seguinte ordem e datas dos respectivos  ingressos das mulheres na Academia de Letras de Ilhéus na condição de efetiva do sodalício: Janete Mendonça Badaró – 14.03.1984; Neuza Maria Kerner – 28.12.1989; Maria Luiza Figueiredo Heine – 21.12.2000; Maria Luiza Nora – 29.06.2001; Zélia Gattai Amado – 14.03.2002;  Maria Schaun – 05.04.2002;  Eliane Oliveira Sabóia Ribeiro – 30.11.2006;  Neide Silveira de souza – 30.04.2010; Neuza de Oliveira Nascimento – 05.11.2012; Anarleide Cruz Menezes – 26.05.2017;  Jane Hilda Mendonça Badaró – 22.09.2017;  e Luh Oliveira – 30.11.2018.

 

Então, hoje, a imortal feminina com mais tempo de casa na ALI, é a professora e escritora Neuzamaria Kerner. Ela é autora de diversos livros, entre eles: “Fragmentos de Cristal”, “Eu Bebi a Lua”, “A Presença do Mar em Grapiúna”.  Em “Pe    quena Sabatina ao Artista” constante nas “Levas” da Revista Diversos Afins, cujo periódico é liderada pelo jovem editor Fabrício Brandão,  a entrevistada Neuzamaria Kerner nos oferece um traçado da sua produção literária.  Por sinal, percebe-se que é pujante. É uma entrevista peculiar, pois, a imortal discute o papel da mulher na sociedade. Em seu livro “O Livro-arbítrio das Evas – dentro e fora do Jardim” (Editus – 2014) é oportunidade para repensar o lugar dos sujeitos.

Em “Academia de Letras de Ilhéus 
A chegada das Mulheres”, Maria Luiza Heine registra a participação feminina nos quadros literários das academias. A senhora Heine pertence ao quadro da Academia de Letras de Ilhéus, ocupando a cadeira n.º 20, foi morar em Ilhéus nos anos 70. Graduou em Filosofia pela Fespi, atual UESC, posteriormente, cursou Especialização em História Regional e Mestrado em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente. É doutora em Educação pela UNEB. Tem uma vasta obra de pesquisa sobre a história regional, meio ambiente e tem atuado fortemente com pesquisa e extensão universitária. Foi professora da Faculdade de Ilhéus, do IME e presidiu a Fundação Cultural de Ilhéus.

Na ordem de mulheres empossadas na Academia de Letras de Ilhéus, Maria Luiza Nora, Baísa, como é carinhosamente chamada, foi à  quarta. Durante bom tempo na Editus, colaborou permanentemente para a difusão intelectual regional, especialmente, desde 2006 quando foi criada a editora universitária da UESC. As inúmeras obras publicadas de escritores da região asseveram o comprometimento dessa intelectual com a cultura. É a autora de a “Ética da Paixão” (2010), Margarida Fahel, na apresentação do livro, indica que a poesia da escriba revela o poder essencial da forma e da palavra e avança considerando que a escritora “consegue momentos de pura expressão, em que a palavra se faz forma e gesto inscritos no ar.”

 

A imortal Maria Schaun faz parte desse celeiro regional das letras. Comunicóloga de formação pela UFBA, tem um trabalho voltado para a preservação da memória regional, como anteriormente registrado, ela teve o trabalho de sistematizar a data de posse das imortais. Tem pelo menos dois livros escritos, um batizado de “Elo perdido”, que possibilita verificar as origens das famílias em Ilhéus, consequentemente, no sul da Bahia e “Nelson Schaun – merece um livro”, que apresenta para nós parte da formação da intelectualidade sul baiana. Livros que merecem estar em nossas referências toda vez que tratarmos da região do cacau. A confreira tem um papel de relevo na organização, envolvendo-se positivamente nas atividades da Academia e contribuindo com o sucesso das atividades.

A ALI contata também com a presença da professora Eliane Sabóia, que estudou sobre a literatura do cacau entre 1950/75; foi professora da Universidade Federal Fluminense desempenhando um significativo papel nos estudos da literatura lecionando no Instituto de Arte e Comunicação Social. Ela integra o Instituto Histórico e Geográfico de Ilhéus.

 

Os imortais elegeram Neide Silveira para fazer parte do seleto clube regional, pois, perceberam na professora a oportunidade de reconhecer a preocupação da mesma com a educação sulbaiana, assim como os esforços da educadora na implementação da educação patrimonial. A imortal Eliane Sabóia, quando da elaboração do parecer para recomendar a eleição da indicada, registrou como um currículo vitorioso com uma vasta formação, indicando-a como uma “Personalidade que ocupa na História da Educação, Arte e Cultura de Ilhéus, um papel relevante.”.

 

 

A juíza Neusa Nascimento tomou posse na Academia em 05 de novembro de 2012. De tradição jurídica, colaborou ativamente para o funcionamento da Academia, quando dos encontros dos membros na casa do doutor Ariston Cardoso, ela era que providenciava os chás. O professor Josevandro Nascimento foi quem fez a saudação a nova imortal, naquela oportunidade, ressaltou a trajetória da carreira jurídica ao ela servir ao direito e à justiça em Ilhéus por quase 20 anos.

 

 

A acadêmica Anarleide Menezes tomou posse em 26 de maio de 2017, há dois anos, vem da tradição da preservação patrimonial. Foi saudada pelo acadêmico Geraldo Lavigne. Ela tem conduzido com maestria a preservação do Museu do Instituto Nossa Senhora da Piedade e não só isto, a sua atuação nesta área tem disseminado uma nova perspectiva na região com seminários, palestras.

A advogada Jane Hilda assumiu a cadeira n.º 6. É artista plástica de mão cheia de tinta e pincel equilibrados, professora universitária, jornalista, escritora. Exercícios que a qualificaram para fazer parte da ALI e, certamente, colaborará para o empoderamento feminino e enriquecimento do ambiente acadêmico literário. É atualmente a Secretária – geral da instituição, responsável por registrar a vida da organização. Função que permite outras pessoas no futuro conhecerem melhor o funcionamento da Academia e que outras análises possam ser feitas.

A mais nova imortal a tomar posse na Academia, Lú Oliveira, chegou ao fim de 2018. Lendo seu livro “Lhuminosidades”, aliás, ela vai escrevendo tudo com” h”, brincando e nos convencendo do poético como instrumento do viver bem, do se atentar para os fatos da vida. A escritora vai construindo uma vasta carreira literária. Ela também foi a última a ser empossada entre todos os membros efetivos.

Então, neste momento, a Academia de Letras de Ilhéus possui atualmente dez mulheres como acadêmicas efetivas, totalizando 25% das cadeiras, do geral de quarenta vagas.  Sendo que este número ganhou uma maior dimensão após os anos 2000, quando efetivamente, elas ingressaram nos espaços. No total, doze mulheres fazem parte da história desse ambiente acadêmico ao levar em consideração as passagens de Janete Badaró e de Zélia Gattai já falecidas. É óbvio que a demora esteve muito mais associada a outros aspectos que competência feminina, pois, elas sempre brilharam no sul da Bahia na produção literária, científica, nas áreas do ensino, do direito e da saúde entre outros campos. Elas brilham no Brasil e em qualquer parte do mundo. Afinal, o lugar da mulher é onde ela quiser. Assim seja! Que as imortais sulbaianas continuem a nos oferecer poesias, crônicas, romances, contos…

A presença feminina nesses espaços significa a afirmação da diversidade intelectual sob a ótica da inclusão, do respeito e acolhimento ao pensamento feminino nas diferentes áreas, seja no fazer literário, seja no fazer científico, seja no gerenciamento educacional… As mulheres têm buscado ocupar os diversos lugares e continuarão a ocupar, basta que as não atrapalhemos. Certamente, esperamos que as mulheres continuem a frequentar não só esses espaços, mas também os diversos outros.  Contei aqui parte de suas histórias, mas estou cônscio de que elas mesmas não precisam de ninguém para contar, pois, bravamente resistem e nos ensinam outro caminhar como possível. De fato, Francolino Neto, elas chegaram com brilho, competência e glamour. Bom que o senhor já nos advertia e alertava para os novos tempos. Certamente, a sabedoria e a tolerância são caminhos para nos afastar dos tempos sombrios de ontem e de hoje.

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Efson Lima  –   Doutor e mestre em Direito/UFBA.Professor universitário e advogado. Membro da Academia Grapiúna de Letras e membro -eleito para Academia de Letras de Ilhéus.