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Roberto C. Rodrigues

O geógrafo brasileiro Milton Almeida dos Santos (3 de maio de 1926 – 24 de junho de 2001) dedicou um capítulo inteiro ao Banco da Vitória no seu livro Zona do Cacau, publicado no ano de 1955. Neste livro Santos cita que o Banco da Vitória foi a primeira capital do cacau, antes mesmo das cidades de Ilhéus e Itabuna receberem este título.

livro zona do cacauMilton Santos era um geógrafo internacionalmente reconhecido. Era também graduado em Direito e destacou-se por seus trabalhos em diversas áreas da geografia, em especial nos estudos de urbanização do Terceiro Mundo. Foi um dos grandes nomes da renovação da geografia no Brasil, ocorrida na década de 1970. Também se destacou por seus trabalhos sobre a globalização nos anos 1990. A obra de Milton Santos caracterizou-se por apresentar um posicionamento crítico ao sistema capitalista, e seus pressupostos teóricos dominantes na geografia de seu tempo.

Milton Santos nasceu no município baiano de Brotas de Macaúbas em 3 de maio de 1926. Santos foi professor catedrático no Colégio Municipal de Ilhéus. Nesta cidade, além do magistério desenvolveu atividade jornalística, estreitando sua amizade com políticos de esquerda. Nesta época, escreveu o livro Zona do Cacau, posteriormente incluído na Coleção Brasiliana, já com influência da Escola Regional francesa.

No Livro Zona do Cacau, o capítulo 6 é dedicado exclusivamente ao Banco da Vitória, descrevendo os momentos áureos da comunidade e o seu declínio econômico e social.

Para poder validar meu argumento agora exposto, quanto a importância do Banco da Vitória para formação da Região Cacaueira e principalmente para o município de Ilhéus no início do século XX, transcrevo o capítulo do livro de Milton Santos.

A antiga Capital do Cacau

Quem passa, hoje, por Banco da Vitória, a quinze minutos de automóvel da cidade de Ilhéus, cerca de onze quilômetros de percurso, talvez nem repare no seu modesto arruado, formado apenas por 4 ou cinco artérias, uma das quais acompanha o traçado da rodovia. Mas a repousante localidade que os mapas não registram já foi, e em tempo não remotos, a “metrópole do cacau”. Era ali o centro, a sede do incipiente comércio da preciosa amêndoa, onde todos quantos a produziram tinham que apoiar um pouco de montaria, ante de retornar viagem.
Isto foi no tempo das tropas de burro, quando o homem começava a não ter medo da natureza hostil e enfrentando todas as intempéries, plantava os fundamentos de um novo bandeirismo, com a epopeia do cacau.

Depois, quando áreas maiores se foram conquistando e do seio da terra fecunda foram surgindo cada vez mais os grãos de ouro, veio o trem roubando de sua influência a produção de vasta zona e veio o caminhão, cuja estrada primitiva passa a alguma distância do povoado.

Banhada pelo rio Cachoeira, rio de planalto, em cuja margem esquerda se situa, é nela que se encontra o ponto mais alto da navegação e até o advento dos veículos motorizados, todos os lavradores vinham trazer ali o resultado de sua lavoura, que, em canoas, demandava o porto de Ilhéus, de onde, então, podiam ganhar o seu destino, no estrangeiro.
Exemplos de como a mudança nos meios de transporte é capaz de contribuir para o estacionamento ou regresso dos núcleos humanos, Banco da Vitória, foi, pouco a pouco perdendo a antiga importância. Mas tarde, quando se juntaram os melancólicos apelos dos moradores que desejavam sentir, mas que de perto o ruído dos motores de explosão, às necessidades técnicas de encurtar o traçado da estrada de rodagem, esta fez seu caminho pelo fundo das casas, limitando com o rio a área do vilarejo. Não demorou, entretanto, que habitações se fossem levantando de um lado e de outro da rodovia e partindo dela, novas artérias crescessem. Era da estrada a importância. O rio cuja serventia era agora mínima, ficou para os despejos da população. As casas já não olhavam mais para ele. Viraram-lhe as costas, namorando agora e somente a estrada de rodagem.

Triste destino o desta outrora florescente capital do cacau, ao amar tão fortemente o móvel da sua própria ruína. Vila de Banco da Vitória, assim é conhecida oficialmente por ser cabeça de um distrito. Mas, geográfica e sociologicamente vila não é, pois, não atende as condições precisas para tanto: os agricultores que lhe moram em torno, do seu pequeno comércio não se utilizam para aquisição das utilidades essenciais à sua sobrevivência. Fazem-no mesmo em Ilhéus, diretamente. É, de fato, um subúrbio, arrabalde, bairro, ou que outros nomes lhe queiram dar, em relação a nova capital do cacau, pois até os seus moradores, exceto alguns saudosistas e outros que comercializam ou têm funções públicas, como funcionários do Matadouro, exerce sua atividade em Ilhéus. Ela que já foi cidade, pela natureza das funções que desempenhava, pela sua importância regional, é hoje subúrbio e mais ainda o que será quando concluída a pavimentação da rodovia Ilhéus-Itabuna, o que não deve demorar muito. Ficando, assim, a menos de dez minutos da sede municipal será certamente lembrada para “weekends” e alegres “pic-nics” nos seus bosques umbrosos.
Banco da Vitória é um magnífico exemplo de povoação sacrificada, a bem-dizer, pelo progresso. ”
Zona do Cacau, capítulo 6, páginas de 73 a 76. Publicado em 1955.

Nota-se então, pelo exposto pelo renomado doutor Milton Santos, porque escolhi o título deste livro como Banco da Vitória, A História Esquecida das Margens Vitoriosas do Rio Cachoeira.

O Banco da Vitória que já foi, segundo o autor supracitado, a primeira capital do cacau e muito maior que muitas das cidades do sul da Bahia, não consta nem como coadjuvante secundário da história oficial de Ilhéus.

O intuito deste livro é também reparar este erro e dessa forma colocar nossa comunidade no grau de importância social e histórica do sul da Bahia.

O Banco da Vitória foi, por certo o umbigo da região cacaueira do sul da Bahia e a sua importância jamais deve ser negada, ofuscada e esquecida.