Efson Lima

 

efson limaEstamos em um ano eleitoral atípico, é verdade, mas é 2020. Os candidatos se lançam aos processos eleitorais e elaboram seus programas de governo. Muito bem! Nas democracias representativas os procedimentos são esses. O processo pode ser melhorado quando os candidatos dialogam com a sociedade civil organizada e os cidadãos e vão concretizando a soma dos interesses públicos no citado documento.

Muitos devem estar se perguntando, que diacho tem literatura com eleições, acesso à leitura? Tem muito a ver. Primeiro, as vitórias e as derrotas eleitorais são contadas sob as diferentes óticas.

 

Vamos falar muito da pandemia enquanto circunstância que definiu o resultado de muitas eleições. Anteriormente, em outro pequeno artiguete, tive a oportunidade de defender que a literatura nasce na imaginação e movimenta uma cadeia produtiva de uma sociedade ao possibilitar uma “fábrica criativa de escritores” ao serem publicados, tem -se os vídeos, os áudios. Temos também os diagramadores, os revisores, os designers… que vão aumentando o rol de trabalhadores no mundo da produção literária. Literatura é fator de desenvolvimento econômico em um país.

Mas para além do trabalho, literatura também é lazer. É meio civilizacional de uma sociedade, de um grupo. Portanto, a literatura deve ser compreendida como um processo possibilitador de reflexões sobre ontem, hoje e o amanhã. É meio para a libertação de um povo. É caminho para a afirmação de um Estado Democrático de Direito. É “o sonho acordado da civilização” como afirmou Antonio Candido.

Não é possível pensar uma gestão municipal sem colocar o campo da educação, especialmente, de parte do ensino infantil e fundamental na ordem do dia. Não alcançará uma qualidade no ensino sem a alfabetização das crianças e da juventude. Infelizmente, o jovem e o idoso precisam ser alfabetizados. O “infelizmente” adotado não é porque são jovens e idosos, mas porque a alfabetização deve ocorrer ainda na infância.

Na segunda semana do mês de setembro, o Instituto Pró-Livro divulgou a pesquisa sobre leitura no Brasil – “5ª. Edição da Retratos da Leitura no Brasil”. Entre as constatações, sabemos que o número de leitores no Brasil diminuiu, a redução foi de 4.6 milhões de pessoas; temos 29% da população sendo considerada analfabeta funcional no país. Entre os que frequentam as bibliotecas, 17% avaliam como bons os serviços e 43% dizem não encontrar os livros pelos quais estão interessados. Triste sina!

Tem um dado animador: a pesquisa concluiu que faixa etária que abarca crianças de 5 a 10 anos teve um aumento de leitores. A pesquisa foi realizada em 208 municípios e aplicada para 8 mil pessoas. Temos um desafio é enorme.

A cidade de Ilhéus por ter uma Academia de Letras, talvez, a mais antiga instituição do gênero no interior do estado da Bahia e uma das mais ativas, tem entre seus quadros ex -prefeitos, entre eles: Ariston Cardoso, Eusínio Lavigne, Euclides Neto e Jabes Ribeiro. Este último vivíssimo! Graças!
Entre os ex-prefeitos, tive a oportunidade de conhecer dois. O doutor Ariston Cardoso conheci pela ironia da vida. Uma professora de geografia, no IME, passou uma pesquisa que tinha como objetivo entrevistar uma pessoa que falasse sobre Bolsa de Valores. Meu colega Ezequiel me chamou para ir ao escritório de um advogado.
O advogado era Ariston Cardoso. No escritório fomos bem atendidos. Chegamos sem marcar horário, mesmo assim ele prontamente nos atendeu. As palavras saltavam da boca do homem. Não precisou consultar livro. Nada disto. A inteligência era visível. Eu e meu amigo fomos anotando no caderno. Lembro-me que foi uma folha cheia de anotações. Nada melhor que encantar um jovem que morava no Basílio e outro no Teotônio Vilela com conhecimento.
Por falar em letras, foi o então prefeito Jabes Ribeiro que doou a casa onde está instalada a Academia de Letras de Ilhéus, cuja Instituição tem realizado diversas ações na área da promoção da literatura, inclusive, alguns de seus membros estiveram envolvidos na construção do Festival Literário Sul-Bahia. O gestor público não pode se afastar as instituições culturais, pelo contrário, precisa ver nelas a oportunidade de ressignificar, pensar estratégias e soluções. Não sem razão, Jabes Ribeiro conseguiu efetivar diversas ações no setor cultural em Ilhéus, mais uma vez entre elas: a entrega da Casa Jorge Amado e a Biblioteca e o Arquivo Municipal.

Entre os ex- prefeitos que se vincularam a Academia de Letras de Ilhéus, temos Euclides Neto, que foi prefeito em Ipiaú. Da área do direito, ele foi capaz de estabelecer uma interface entre o direito agrário e a literatura, inclusive, possuindo uma vasta produção literária que aborda o homem do campo e as relações de trabalho e ainda quando prefeito criou a Fazenda do Povo, uma experiência embrionária de reforma agrária formulada por um gestor municipal.

E Eusínio Lavigne? Este merece um artigo próprio. Mas dos registros, podemos afirmar que ele participou da fundação da Academia de Letras de Ilhéus e ocupou a cadeira 19. Foi um homem culto, tendo diversas publicações. Lembro-me das histórias contadas pelo professor Arléo Barbosa no cursinho ao falar do Estado Novo.

Apesar de eu ter citado alguns nomes de gestores vinculados às letras, peço licença para dizer que não é necessário ocupar esses espaços para se preocupar com a cultura, com a literatura e o acesso à leitura. Basta ter compromisso com a cidadania que a obrigação estará posta enquanto fundamento do bem – estar social e do múnus público.

Ainda continuarei a defender Ilhéus como uma cidade literária, inclusive, pode pleitear no âmbito da UNESCO o título de cidade criativa na área da literatura. A única cidade de língua portuguesa considerada criativa na área da literatura é Óbidos em Portugal. Não obstante, pode ser aproveitado o Plano Municipal de Cultura, nele tem muita coisa para área da literatura.

 

Aproveitemos o pleito municipal para entabular nossos pedidos republicanos.

Então, literatura, acesso à leitura e gestão municipal tem muito a ver.

 

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Efson Lima – doutor em direito/UFBA. Advogado. Professor universitário. Aprendiz de cronista. Apaixonado pelas terras sul baianas. efsonlima@gmail.com