Efson Lima

efsonÉ pelas mãos da literatura que transformamos a realidade em ficção ou possibilitamos a ficção adentrar em nosso universo e, assim sendo, cuidamos de mesclá-la para o real, configurando o imaginário em “verdade” até onde for possível.  Os mitos povoam nossas cabeças, assim como os cabelos, neste caso até quando a calvície chega e começa a cair cabelo a cabelo, assim também acontecem com os mitos, vamos crescendo e eles vão desaparecendo. No passado, os mitos insistiam em permanecer conosco. Eram nossas formas primeiras de conceber a literatura.  Agora, desaparecem logo com o avançar da idade. O cotidiano cuidou de ceifar o imaginário, impondo à dura realidade, vamos matando a ficção ou corremos à ficção para nos refugiar. Acho que estou seguindo essa última assertiva.

Os mitos parecem que perderam densidade. Refiro-me aos mitos de cunho literário. Quanto aos mitos que estão em voga no Brasil, a estes prefiro dispensar comentário. Não estou à altura. Gosto mesmo é das crônicas que são publicadas no Blog do Thame, especialmente, as do Barão de Pau –d` Alho, uma obra prima, que  nos faz sair do lugar e refletir sobre onde chegamos. Pessoas assim nos elevam, orientam-nos. É bússola para nos guiar. Dois sulbaianos, que se conheceram na posse de Marcus Vinicius Rodrigues na Academia de Letras da Bahia. Eu que há anos já era leitor dele, cronista de melhor qualidade na região, fiquei surpreso pela simplicidade humana e pela generosidade, fui conduzido pelo professor e imortal Aleilton Fonseca, membro das Casas de Fragoso e de Abel. Neste mesmo dia, conhecia também André Rosa, presidente da Academia de Letras de Ilhéus, que tão bem sintetizou sobre a nação grapiúna em “Memória e Literatura: a invenção dos grapiúnas” no artigo publicado em Especiaria – Cadernos de Ciências Humanas. A literatura aproxima seus filhos. Tem a capacidade de abrir caminhos, superar distâncias e inventar sentido.

efsonNão sei exatamente quando os mitos deixaram de povoar minha cabeça. Informo que ainda não estou careca, por enquanto, a calvície não me atingiu. Espero que ela continue distante.  Assim, não perco tempo com ela e sobra tempo para tratar de questões do mundo literário.

Pergunto-me até hoje qual é a finalidade da literatura?  Respondo vagamente que a literatura permite refrigerar a alma, contar estórias e histórias. Possibilita registrar fatos, acontecimentos. É meio de juntar textos e criar relatos… Literatura é meio de contar o mundo de coisas, fatos, animais, pessoas, de inventar o inventável. É instrumento de criação e de inovação. É terapia de oferecer sentido ao que parece não ter sentido. É assim que posso dizer que se a infância foi cruel comigo, pois, passei quase toda ela sem saber ler, foi na adolescência que a leitura me fez surgir como sujeito e a palavra jarra foi a minha libertação.  Eis que lia minha primeira palavra. Ufa! Foi tarde. Agora não só lia o mundo com os olhos, a leitura possibilitava melhorar a leitura do mundo. Foi nas terras de Entroncamento de Itapé que me fiz menino e aos 11 anos partia como se partem tantas famílias à procura de viver bem. Isto é verdade? Pode ser, pode ser não. A literatura tem essa capacidade de transformar o imaginado em fato e o fato em imaginação. Emancipa-nos.

A literatura possui a aptidão de transformar as estórias em representações. Os fatos em acontecimentos – presentes. Foi pelo teatro de Pawlo Cidade, que assisti ao primeiro espetáculo no Teatro Municipal de Ilhéus, não me lembro o nome, mas lembro-me do sertão, da caatinga e de lampião, da estética do espetáculo como um todo. Isto foi nos idos de 2002/2003.  Portanto, a literatura nos coloca diante desse cenário, pode misturar estórias com História.  Assim fez Pawlo Cidade, conduziu-me para esse novo lugar.  É nesse processo que vislumbro perfeitamente a literatura amadiana, os jornais impressos já tinham me conquistado, agora, faltava à literatura. Enveredei-me primeiro com Capitães da Areia e sucessivamente até perder a contagem. É Pawlo Cidade que me fez retomar a leitura dos escritores regionais. Vi postagem sobre o Santo de Mármore e adquiri o livro. Ao fazer a leitura do livro, fiquei impressionado pelo volume informacional ao tempo que me questionava se eu estava diante de fato – verdade ou fato – ficcional.

Cada capítulo me aproximava da obra, pois, entre os anos 2002/2004, vivenciei o movimento estudantil em Ilhéus e a obra de Pawlo possibilita uma intertextualidade entre o vivido por mim (menor importância) e o que é retratado no livro, ao narrar que o início do movimento estudantil em Ilhéus no final dos anos oitenta, embalado pelo fim do regime militar e pela crise econômica que afetou dezenas de municípios baianos, especialmente, os da zona do cacau. Era, segundo o autor, a primeira vez na história da cidade, que estudantes entravam em “greve”. Quais são fato – verdade e fato- ficcional só ele para nos contar reservadamente. Portanto, foi à dramaturgia de Pawlo Cidade que me apresentou uma nova estética, assim como a sua literatura romanesca me aproximou da literatura dos escritores regionais. Assim, não só temos um escritor, temos também um diretor teatral, um ator, sem falar no gestor cultural. É positivo quando conseguimos fotografar pessoas que conseguem fazer com maestria ao que se propõe.

A literatura possui a capacidade de imortalizar obras. As palavras edificam e quando lançadas ao vento florescem diuturnamente. Imortaliza também as pessoas, ao falar da plena imortalidade, lembramos da passagem de dois grandes construtores que se despediram no ano do sexagenário aniversário da Academia de Letras de Ilhéus, sendo: o Ministro José Cândido, um dos fundadores do silogeu e também da Faculdade de Direito de Ilhéus, que mais tarde seria FESPI e, posteriormente, UESC; perdemos também João Hygino, imortal da cadeira 01, advogado, jornalista e escritor.

Nesta semana, em virtude da Semana de Altos Estudos Jurídicos da Faculdade de Direito da UFBA, visitei o memorial da instituição, fui agendar visitas e conversas para tratar dos imortais da ALI, que estudaram na Faculdade de Direito, perguntava por Milton Santos, Cyro de Mattos, nosso grande poeta, da região para o mundo. Um poeta comprometido com o meio ambiente, recordo os Vinte Poemas do Rio, que transborda memória, precisarei ir em direção a outras unidades da universidade-mãe, terei também que verificar o acervo da UESC, buscando identificar como a Academia de Letras de Ilhéus foi embrião do nascimento intelectual da Nação Grapiúna. Seria a busca do elo intelectual do sul da Bahia? Vamos conhecendo esses fatos no Blog do Thame.  E nele que vou buscar cobrir as relações Salvador – Sul da Bahia – Ilhéus – Itabuna e Itapé.

Efson Lima  – coordenador-geral da Pós-graduação, Pesquisa e Extensão da Faculdade 2 de Julho, coordena o Laboratório de Empreendedorismo, Criatividade e Inovação, além de ser doutorando, mestre e bacharel em Direito pela UFBA. Organizador de seis livros no Projeto Conviver/UFBA e autor do livro “Textos Particulares”, no prelo.