rui costaGovernador da Bahia, Rui Costa, no Valor Econômico:

(…) Valor: Atribui-se a vitória de Jair Bolsonaro, em grande parte, ao antipetismo que teria contaminado os brasileiros, ante as denúncias de corrupção nos governos petistas. O governo errou em não fazer uma aliança para apoiar Ciro Gomes, do PDT?
Rui: Não foi o antipetismo que venceu a eleição, foi a antipolítica, a rejeição ao establishment. O povo votou contra os políticos que representavam a política tradicional, contra esse modelo de alianças do toma-lá-dá-cá. Foi esse o recado. Quem por interesse político-partidário quiser fazer a leitura de que foi antipetismo, que faça. O Ciro [Gomes] bateu no PT, o [Geraldo] Alckmin bateu forte no PT a campanha inteira. Se alguém queria votar contra o PT, votaria no Alckmin, governador de São Paulo, com experiência de gestão.

Valor: Então o senhor acha que o PT não saiu derrotado da eleição?
Rui: O Alckmin foi governador quatro vezes, e perdeu feio no Estado dele. Quem foi o grande derrotado em São Paulo: o PT ou o Alckmin? Quem tinha força eleitoral? Se eu perdesse na Bahia, o derrotado seria o PT, porque eu era o governador. Ao perder de forma tão fragorosa, o grande derrotado em São Paulo foi o PSDB.

Valor: Mas Bolsonaro é deputado há 27 anos, como o senhor acha que ele conseguiu se apresentar aos eleitores como “o novo”?
Rui: Aí só procurando um cientista político, um sociólogo, um psicólogo para explicar como ele conseguiu passar essa imagem. Mas conseguiu, mérito dele. Apesar de ser deputado há 27 anos, de ter participado de todas as votações, de todas as negociações na Câmara, ele conseguiu por alguma fórmula passar a imagem de que ele era o novo, e que não fazia parte dessa política tradicional. Ele encontrou uma fórmula de encantar e convencer os eleitores que ele era diferente de tudo isso que está aí.

Valor: E que lição o PT tira dessas eleições?
Rui: Não só o PT, mas os políticos precisam tirar uma lição. Primeiro de tudo, precisam estar mais próximos do povo, ser menos distantes da população.

Valor: O senhor acha que o PT se distanciou da população?
Rui: Não tenho dúvida disso. Mas, veja: assim como toda instituição, o PT é composto de gente. E as pessoas têm comportamentos diferentes. Então em muitos lugares, ou nacionalmente, a gente se distanciou. Tanto se distanciou que perdeu a eleição. A segunda lição é de que não podemos ficar reproduzindo acordos políticos que o povo não enxergue como benéficos à sociedade. Acho que é preciso cuidar de temas muito valorosos, como saúde, educação e segurança.

Valor: Como o PT pode reverter esse quadro para se reconectar com a população?
Rui: Os partidos todos têm que repensar sua forma de atuação, talvez seja o momento até de se formar novos partidos, com novas práticas políticas, defendendo novas questões, mais próximas ao interesse da população. De forma mais sincera, mais verdadeira, olho no olho das pessoas. É o que o povo quer.

Valor: O senhor afirma que não foi o antipetismo que derrotou o PT nas urnas, mas esse sentimento não motivou uma parcela dos eleitores?
Rui: Esse processo todo mostrou que no PT tinha gente também que estava fazendo coisa errada, mas como ocorre em todos os partidos, sem exceção. Não é filiação partidária que define o comportamento das pessoas. Eu acho é que precisamos juntar os homens e as mulheres de bem, que têm bons propósitos na política, para construir uma nova agenda para o Brasil, para que ele se pareça com os principais países do mundo.

Valor: Para esse modelo se viabilizar, se for o caso em 2022, o PT pode apoiar um candidato a presidente de outra sigla?
Rui: Já defendi essa possibilidade nesta eleição. Eu e Wagner [o senador eleito pela Bahia, Jaques Wagner], além de outras pessoas do PT, defendemos essa possibilidade já neste ano. Na política, se você quer o apoio de alguém, tem que admitir a possibilidade de apoiar outra pessoa. Se você acha que só pode receber apoio, nunca apoiar, isso não é uma boa prática política. Se acha que só você presta, e ninguém mais, por que vai querer o apoio de quem não presta?

Valor: Mas como essas alianças se processariam?
Rui: Nossa missão é juntar todos aqueles, independentemente se estão no PT, no PCdoB, no PSB, no PSDB, no PP: onde tenha gente que queira construir uma nova prática política, feita com seriedade, verdade, e honestidade, acho que essas pessoas são nossas aliadas para construir o Brasil. A gente não pode fazer cerco ideológico a partido, o critério não é esse, e o povo já disse na eleição que não aceita mais esse comportamento. (…)