Eulina Lavigne

 

eulina lavigneDurante muito tempo em minha vida sentia pena. Pena daqueles que eram de alguma forma discriminados, que por algum motivo sofriam ou entendiam que eram injustiçados.

Até que a vida me ensinou que precisava trocar o sentimento de pena pelo sentimento de compaixão. A palavra compaixão deriva do latim compassio – ato de partilhar o sofrimento do outro, ou melhor, olhar para o outro com olhos amorosos. Olhar com os olhos do coração.

Aprendi que pena é um sentimento que retira do outro a sua dignidade. É como se nos colocássemos em uma posição superior àquele Ser que se encontra em situação vulnerável, e este seja incapaz de sair do lugar ou da situação em que se encontra.

Devemos sempre dignificar o outro para que se fortaleça e altere a sua situação. Só quem se encontra em uma situação que lhe enfraquece pode escolher sair dela a partir de um novo olhar sobre aquela situação. Não somos super-heróis e nem salvadores da pátria. Podemos sim ser agentes de mudança, trazendo um novo ritmo, um novo tom para o outro experimentar ou até uma nova dança. E o outro tem livre arbítrio para entrar ou sair da dança e se responsabilizar pela escolha que fizer.

E voltando à compaixão, esse olhar amoroso precisa ser um exercício diário e constante. O olhar compassivo cobra de nós paciência e persistência. Cobra também atenção e escuta para perceber o que há por traz de ações que desejam se perpetuar no Ser, e que o faz ficar paralisado quando precisaria agir.

Logo que cheguei para morar em minha comunidade fui informada que o filho de um dos parceiros com o qual divido a minha terra estava com um caroço muito grande no pescoço. Imediatamente chamei a mãe e filho para verificar do que se tratava.

Há três anos aquele menino de 15 anos estava com aquele caroço e os pais, mesmo sem recursos gastaram quase R$2.000,00 com exames particulares e deixaram de tomar providencias quando um médico cobrou R$7,000,00 para fazer a cirurgia do garoto. Há três anos que aqueles pais deixaram de acreditar que valia a pena lutar pela vida daquele filho.

Imediatamente levei mãe e filho para a cidade e providenciei uma consulta médica. A consulta foi marcada e a mãe não compareceu. A minha primeira reação foi de raiva. Raiva daquela mãe inconsequente, desumana e ponha adjetivos em minha boca.

Respirei e remarquei pela segunda e pela terceira vez, pois a mãe não conseguia ir com aquele adolescente ao médico. Fiquei indignada por um instante, e logo saí desse lugar pois o nosso mestre Bert Hellinger, mentor da Constelação Familiar, ensina que quando nos indignamos nos vitimizamos  e nos eximimos da responsabilidade. O negócio é partir para a ação.

Dei uma nova respirada e perguntei àquela mãe o que ela acreditava que estava informando ao seu filho sem sequer dizer uma palavra.  Ela não tinha a resposta. E eu precisei informá-la que estava a dizer: Meu filho, não vale a pena lutar pela Vida! Então ela chorou.

Aquele choro tocou o meu coração e perguntei quantos anos ela tinha quando nasceu o primeiro dos seus cinco filhos. E ela cabisbaixa me respondeu que tinha 15 anos.

Foi o suficiente para eu compreender a sua dificuldade. Ela provavelmente não foi cuidada, e sem tempo de se cuidar desconhecia de que forma poderia cuidar daquele filho.

No fundo era o medo de não dar conta do diagnóstico que poderia vir a ser.

E foi a compaixão que me fez remarcar o exame do seu filho e dizer a ela que estaria junto  na consulta e eu não diria uma palavra. Apenas para que ela se sentisse um pouco cuidada e fortalecida para agir.

Confesso que julguei aquele pai e aquela mãe, e graças a Deus penso que foi a paixão e o amor que tenho pela vida que me fizeram incluir outras possibilidades. Que me fizeram enxergar  que nem sempre uma falta de ação é simplesmente uma omissão. Há muita dor e um grande segredo: o medo.

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Eulina Lavigne é mãe de três filhos, terapeuta clínica, Consteladora há 11 anos, Especialista em trauma, Mestra em Reiki Xamânico, Palestrante, Consultora em envolvimento humano e organizacional.