Débora Spagnol

debora 2Fabíola, Léo e Carlos Eduardo tornarem-se trio conhecido nas redes sociais após protagonizar um vídeo gravado em um motel que, divulgado, viralizou.

No referido vídeo, filmado por um terceiro e supostamente divulgado pelo marido, o traído agride verbal e fisicamente a esposa, além de destruir seu celular e danificar o veículo do suposto amante. A protagonista ainda sofre ameaças do cinegrafista.

Antes de adentrar especificamente nos crimes a que estão sujeitos os agressores, considero importante ressaltar que a mulher que passa pela exposição de uma cena sexual ou até mesmo de adultério (como o caso de Fabíola) padece de intensa rejeição social e afetiva, o que pode ser explicado, principalmente, pela rígida moral sexual ainda vigente em nossa sociedade, que permanece inflexível apesar das conquistas de gênero.

Tânia Navarro Swain, ao citar Foucault (no livro de Márcia Junges “Os comportamentos ligados à sexualidade são históricos”.), deixa claro que, apesar dos avanços, “No sistema heterossexual, existe uma dupla moral: aquela jungida ao feminino, e a outra, liberal e com limites imprecisos, atrelada ao masculino. Às mulheres, a punição material ou opróbrio social no desvio da norma; aos homens, a condescendência e uma aprovação implícita de derrogação desta última […]”.

Se antigamente o ´macho´ se vingava da rejeição sofrida com violência física (em alguns casos, a morte da mulher traidora era plenamente aceita pela sociedade, sendo que o criminoso ficava impune sob o argumento da “legítima defesa da honra”), atualmente há a alternativa de reagir com violência simbólica, que não fere o corpo da ex-parceira, mas lhe inflige intenso sofrimento emocional ao expor cenas como as que percorrem quase todas as redes sociais e originaram várias piadas, ´memes´ e sátiras.

Assim, pode-se observar que o machismo e o preconceito constituem uma via de mão dupla: na conduta psicopática daquele que divulga as cenas humilhantes da sua ex-parceira (e mãe de seus filhos) e na sociedade que assiste e pune com maior rejeição a sexualidade feminina do que a masculina, quando colocadas sob o mesmo holofote. O autor e o gesto da divulgação imprópria mal são vistos como recrimináveis.

Adultério não é crime – e diz respeito somente às partes envolvidas, já que eventual quebra do pacto de fidelidade/exclusividade deverá ser resolvido da forma mais civilizada possível, principalmente quando há filhos da união.

A conduta do marido em divulgar um vídeo em que agride física e moralmente sua esposa o sujeita à aplicação da Lei Maria da Penha, que visa proteger a mulher contra qualquer tipo de violência.  O artigo 7º dessa lei define as diversas formas de violência que visa punir: física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. O agressor, neste caso, pode estar sujeito à aplicação imediata de medidas protetivas de urgência, como detenção (de três meses a três anos), suspensão do direito de visitas aos filhos, proibição de contato com a ofendida e seus familiares, entre outros. Na área cível, o agressor responde pelos danos morais que a esposa sofrer.

Com relação ao terceiro (amante), o marido pode responder pelas agressões verbais, exposição pública e depredação do patrimônio (celular e veículo), além de ter que arcar com as eventuais se for necessária a mudança de endereço, em razão do preconceito demonstrado pela vizinhança. Responde ainda pelos crimes de violação de intimidade, injúria (qualquer ofensa à dignidade de alguém) e pode ser condenado, além dos danos patrimoniais, ao pagamento de danos morais.

Já a conduta do cinegrafista (filmar sem autorização) fere de morte os direitos constitucionais previstos no 5º, X, que diz ser invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. Ou seja: responde tanto criminal (ameaça e injúria) como pelos prejuízos morais e materiais que causou às partes envolvidas.

O braço forte da lei atinge também quem compartilha nas redes sociais o tão famoso vídeo ou até mesmo ´memes´ e fotografias relacionadas ao episódio, restando também configurado o crime de injúria, principalmente se o material divulgado conter comentários depreciativos e que ferem a honra dos envolvidos. A pena poderá ser de até dois anos.

Do caso, se pode concluir que, ao contrário do que se possa imaginar e embora nossa legislação necessite de grandes avanços na área informática, a internet não é ´terra sem lei´.

E por mais que se tenha prazer mórbido na divulgação das tragédias alheias, a vida pessoal (sexual/emocional) do outro somente diz respeito a ele – questão simples de maturidade, ética pessoal e consciência.

 

(Para leituras mais completas sobre os assuntos ´crimes virtuais´ e ´violência virtual contra a mulher´, sugiro meus artigos públicos nos seguintes links: http://deboraspagnol.jusbrasil.com.br/artigos/232292769/intimidade-na-internet-revenge-porn-nova-forma-de-violencia-contra-a-mulher e http://deboraspagnol.jusbrasil.com.br/artigos/231526566/implicacoes-criminais-no-espaco-virtual)